Classificada com nível "altíssimo" de transmissão, Fortaleza tem 3 mil casos de Covid-19 por semana

A semana correspondendo de 17 a 23 de janeiro, foram 3.383 novos casos de Covid-19

Legenda: Movimentação de pessoas em ônibus, por exemplo, é motivo de preocupação de especialistas - Foto: Helene Santos

Escrito por Nícolas Paulino/Lígia Costa

Número de contágios não era visto desde a semana entre 29 de novembro e 4 de dezembro. Em resposta, Governo decretou restrição a atividades na Capital

O ultimo decreto governamental, restringindo as atividades comerciais em Fortaleza a partir das 20h, causou rebuliço e protesto. No entanto, como salienta o titular da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), Carlos Roberto Martins, o Dr. Cabeto, a medida é necessária para preservar vidas diante do aumento do número de casos na cidade. Nas primeiras três semanas de 2021, a Capital cearense registrou mais de três mil casos a cada sete dias, de acordo com o IntegraSUS.

Atualmente, a plataforma também classifica a cidade no nível "altíssimo" para a transmissão da doença, indicando tendência crescente de incidência de casos por dia e risco "moderado" para o percentual de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), ocupadas por pacientes com a doença. Até as 17h desta quinta-feira, 79,5% dos leitos desse tipo - 304 dos 382 ativos - estavam ocupados na cidade.

O número alto de casos - que não era visto desde a semana entre 29 de novembro e 4 de dezembro - revela um crescimento percebido desde novembro: ao todo, são 12 semanas consecutivas com mais de 2 mil novos testes positivos, cada, segundo o sistema. Nos boletins epidemiológicos publicados em janeiro, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) indica que, hoje, o padrão etário predominante é de pessoas de 20 a 39 anos, totalizando 48% do total.

Entre os dias 3 e 9 de janeiro, foram confirmados 3.073 casos; entre 10 e 16 de janeiro, o número cresceu para 3.561 confirmações; e, de 17 a 23 de janeiro, 3.383. Na última semana do mês, de 24 a 30 de janeiro, acumulam-se 2.834 casos e, na semana atual, que encerra no sábado (6), contabilizam-se 542 confirmações.

Os dados podem aumentar após a liberação de novos exames e a inclusão de mais informações. "Provavelmente, a propagação ainda segue um padrão linear devido à maior barreira imunológica entre os habitantes mais afetados pela primeira onda, que não puderam praticar um isolamento social completo", avalia a SMS.

Transmissão nos bairros

Conforme o documento, uma segunda onda de casos confirmados se deu a partir da transmissão do vírus iniciada entre jovens residentes em bairros nobres da capital, como Aldeota, Meireles e Papicu. A antiga Regional II, onde ficam esses bairros, é a que apresenta maior confirmação na cidade: foram 19.130 até o dia 29 de janeiro, data da última publicação disponível. Já as Regionais VI, área que abrange bairros como Messejana e Lagoa Redonda, e I, onde fica a Barra do Ceará e o Pirambu, por outro lado, sofreram com maior acúmulo de óbitos: foram 777 e 774, respectivamente. A análise sugere que as mortes se concentraram em bairros da periferia, segundo a Pasta.

Foi exatamente em um dos bairros com maior incidência da doença, no Meireles, que a desenvolvedora iOS, Helaine Pontes, 21, diz ter contraído Covid-19. Mesmo acostumada a seguir as regras sanitárias, abriu exceção para se reunir em um restaurante com o irmão e uma amiga no dia 15 de janeiro. "Peguei (Covid) dessa amiga. A mãe dela teve e ela pegou, mas não sabia porque não tinha sintomas", detalha. "No outro dia, a mãe dela fez o teste e deu positivo". Dias depois, Helaine sentiu dor de cabeça, dor de garganta e uma forte tosse. Um exame confirmou que ela também havia sido infectada. "Passei 14 dias em isolamento, mas fiquei bem logo". Ainda assim, pretende redobrar os cuidados. Sobretudo, por causa da avó, de 72 anos, com quem mora, junto aos pais e o irmão. "Desde que eu peguei (Covid), evito sair de casa e uso máscara e álcool em gel".

Risco de colapso

De acordo com Dr. Cabeto, durante o pico da pandemia, até mesmo países desenvolvidos como Itália e Estados Unidos não conseguiram atender à população idosa, diante do rápido aumento de casos. O Ceará, por sua vez, foi capaz de suprir a demanda, mas nada impede que o sistema de saúde estadual entre em colapso em breve, se os casos não pararem de subir. "A depender da exponencialidade (dos casos), pode haver momentos de muita aflição. Se tudo caminhar como está, (em fevereiro) vai aumentar", sentencia.

O aumento no número de internações por Covid, conforme o secretário, vem crescendo na rede privada.

"O número de internações nos hospitais privados já está no limite. Isso é grave e pode chegar na área pública. Isso, por si só, será uma grande lesão à economia do Estado porque pessoas doentes não trabalham".

Diante do cenário preocupante, Dr. Cabeto apelou para que a população e setores da economia mais afetados pelo novo decreto tentem compreender as restrições como necessárias no momento. "(A pandemia) é um fenômeno internacional, é uma espécie de guerra, todo mundo perde. E a gente precisa mitigar essas perdas, principalmente em relação à vida das pessoas", diz, informando que hoje há, inclusive, mais profissionais da saúde adoecidos.

Vacinação

Embora afirme que o número de vacinados é ampliado a cada dia, o secretário também aponta gargalos que ainda "preocupam" no Programa de Imunização. "Tivemos um calendário que atrasou em relação ao (número de vacinas) que estávamos esperando. E tem a questão da aplicação, que precisa estar em consonância com o plano de entrega do Governo Federal. Quando você recebe isso de forma intermitente, causa uma descontinuidade", avalia Cabeto.

VACINÔMETRO NO CEARÁ | COVID-19

Em transmissão nas redes sociais, ontem, o governador Camilo Santana anunciou a chegada de um novo lote de imunizantes. A previsão é que as doses - não contabilizadas - cheguem hoje ao Estado. "Até o momento, mais de 143 mil cearenses foram vacinados. Estou muito confiante que logo tudo isso vai passar".

Imunologista e professor do Departamento de Patologia e Medicina Legal da Universidade Federal do Ceará (UFC), Edson Teixeira lembra que, apesar de a imunização já ter sido iniciada, não há perspectivas de proteção total da população. "Não tem vacina suficiente para ter o controle. Com pouco mais de 1% da população vacinada, o vírus ainda pode se espalhar, sobretudo se ele tiver variantes", explica. "Enquanto não conseguirmos bloquear com a vacina, teremos aumento de casos e, infelizmente, de óbitos".

Justamente pela falta dessa imunidade de rebanho, o especialista aponta a capacidade de dispersão do vírus por estratos sociais que ainda não se contaminaram e continuam circulando, como trabalhadores e pessoas mais jovens. Além disso, ele ainda observa cenas de desrespeito aos decretos estaduais com ocorrências de aglomerações. "Quanto mais pessoas estiverem dentro dos ônibus, shoppings, restaurantes e praias, maior a probabilidade de o vírus se propagar", alerta.

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