Fortaleza volta a ter mais de mil casos de Covid-19 por semana
Desde o início de outubro, boletins da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) alertam para uma maior circulação viral na cidade
Legenda: Fortaleza teve forte alta de casos, que passaram de mil nas últimas duas semanas - Foto: FOTO: HELENE SANTOS
Escrito por Nicolas Paulino
Pela 1ª vez em quase quatro meses, a Capital registra números expressivos de novos casos, segundo plataforma IntegraSUS. Especialistas atribuem aumento à maior testagem e ao relaxamento nas medidas de proteção sanitária
Fortaleza passou 17 semanas, entre março e julho, registrando mais de mil casos de Covid-19 a cada semana epidemiológica. Com a desaceleração da pandemia, o período foi seguido por 14 semanas abaixo desse indicador, da metade de julho à metade de outubro. No entanto, nas últimas duas semanas de outubro, a marca de mil casos confirmados voltou a ser ultrapassada na Capital, de acordo com dados da plataforma IntegraSUS, alimentada pela Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), colhidos na tarde de sexta-feira (6).
A semana epidemiológica 43, que compreendeu o intervalo entre 18 e 24 de outubro, registrou 1.007 confirmações. Ela refletiu a quarta semana consecutiva de aumento na Capital, verificada desde a semana epidemiológica 40, iniciada em 29 de setembro.
Na semana seguinte, de número 44 - de 25 a 31 de outubro -, foram registrados 1.043 casos. Omontante de registros ainda pode mudar a partir da liberação e inclusão de novos resultados de exames.
O educador físico Tancredo Ferreira, de 31 anos, foi um dos fortalezenses atingidos recentemente pela doença, mas que não entrou nas estatísticas oficiais. Há pouco mais de duas semanas, ele começou a sentir moleza no corpo. Dias depois, vieram a febre e a perda do olfato e do paladar. Este último foi decisivo para que ele suspeitasse do diagnóstico, mesmo com o teste de farmácia que usou indicando resultado negativo.
"Quando tive esses sintomas, não fui fazer o teste do cotonete que tinha marcado porque, pra mim, já era Covid. Minha hipótese é que já estava com o vírus, mas peguei chuva, minha imunidade baixou e ele só se alastrou", pensa. Após cumprir o período de isolamento, hoje Tancredo voltou à rotina de dar aulas e não sente nenhuma sequela da doença.
Desde o início de outubro, boletins da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) alertam para uma maior circulação viral na cidade. Entre os dias 16 e 30 de outubro, a proporção de positividade das amostras RT-PCR - o teste "padrão ouro" para detecção - de residentes de Fortaleza analisadas pelo Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (Lacen-CE) foi de 13,2%.
Segundo o biomédico e virologista Mário Oliveira, o potencial de transmissão do novo coronavírus é "altíssimo" mesmo depois de oito meses de pandemia no Ceará pela quantidade de mutações que normalmente ele sofre. "Os coronavírus em geral são altamente mutáveis, até 20 vezes mais que o comum. Em algum momento, ele pode não ter adaptação e ficar inerte. Alguns ficam mais fortes, transmitem mais rápido e conseguem ultrapassar barreiras mais fácil", explica.
Na observação do especialista, o desrespeito às medidas sanitárias, como a falta do uso de máscara, contribui para o novo avanço da contaminação. O número também pode ser atribuído, aponta, à maior testagem realizada pelas autoridades de saúde. "Por enquanto, as instituições estão mais ligadas em fazer o diagnóstico. Consequentemente, quanto mais amostras chegam, mais você tem o aumento de casos", relaciona.
A epidemiologista Caroline Gurgel, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), concorda com a análise. Ela reforça que, com a flexibilização das atividades, parte das pessoas "relaxou nos cuidados de si e dos outros", a exemplo de festas clandestinas e praias lotadas em feriados.
"Antes, a gente estava testando só pacientes graves, que estavam internados. Como agora abrangeu-se mais, você vai encontrar o vírus circulando nas demais faixas etárias. Enquanto tivermos pacientes suscetíveis, independentemente da idade, teremos uma quantidade importante de casos", diz Gurgel.
Na última terça-feira (3), a SMS e a Sesa, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), iniciaram a quarta fase da pesquisa de soroprevalência da Covid-19 na Capital cearense. Estão sendo realizados 3.300 testes, em 112 bairros das seis regionais de Fortaleza, para estimar o percentual de pessoas que já desenvolveram anticorpos contra o Sars-Cov-2.
Além dos casos, a semana epidemiológica 43 também teve aumento de mortes pela doença em relação às três semanas anteriores: foram 10, contra a média de sete das demais. Contudo, o novo cenário não representou impacto direto na letalidade da doença, que vem mantendo tendência de queda desde o pico da pandemia na cidade, no mês de maio.
Em nota, a SMS disse que as ações de prevenção e combate à Covid-19 em Fortaleza estão estabelecidas "com o princípio de atendimento amplo a todos os fortalezenses, com estrutura abrangendo toda a cidade e visando reduzir a proliferação do vírus". Reforçou ainda que o Município segue os protocolos estabelecidos no decreto estadual, priorizando a promoção à saúde.
No que se refere à assistência à saúde em unidades municipais, a Secretaria afirmou acolher pacientes com síndrome gripal nas 116 Unidades Básicas de Saúde e nas seis Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) administradas pela Prefeitura. Além disso, o Município dispõe de 50 leitos ativos exclusivos para pacientes com Covid-19, distribuídos em unidades como o Instituto Doutor José Frota (IJF) e o Hospital e Maternidade Dra. Zilda Arns Neumann.
O virologista Mário Oliveira pondera que, no momento, é "complicado" cogitar um novo lockdown, como o que ocorreu em maio, porque é preciso analisar a questão econômica com mais atenção. Por isso, as pessoas "devem continuar com o uso de máscara, andar com álcool em gel e manter o distanciamento".
A epidemiologista Caroline Gurgel destaca ainda que não se pode falar em imunidade de rebanho porque a última pesquisa de soroprevalência da Prefeitura de Fortaleza mostrou apenas 14% dos residentes com presença de anticorpos. "Mas eles não conferem uma imunização duradoura. Há estudos mostrando que são três meses, outros falam de sete meses. Somente uma vacina muito eficaz para a gente se sentir um pouco mais seguro", afirma.
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