PGR denuncia 37 suspeitos de envolvimento no mensalão do DEM
Procuradoria poupou o ex-governador Joaquim Roriz por 'idade avançada'.
Fabiano CostaDo G1, em Brasília
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, denunciou nesta sexta-feira (29) ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) 37 pessoas suspeitas de envolvimento no mensalão do DEM, suposto esquema de corrupção que teria desviado recursos do governo do Distrito Federal para pagamento de propinas para autoridades.
(Observação: Inicialmente, o G1 informou que 38 pessoas foram denunciadas, conforme divulgou Roberto Gurgel. Com a denúncia em mãos, constatou-se que foram 37 denunciados.)
Gurgel deu a declaração após sessão da qual participou no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta manhã. Entre os denunciados estão o ex-governador do DF José Roberto Arruda (sem partido), apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como chefe da suposta organização criminosa.
O advogado de Arruda, Nélio Machado, disse ao G1 que não havia sido notificado da denúncia. "Estou fora do escritório, assim que chegar vou tomar conhecimento do caso e a gente pode voltar a se falar", disse. No mês passado, ele havia dito que havia falta de conteúdo nas denúncias contra Arruda.
Também fazem parte do rol de denunciados o ex-vice-governador Paulo Octávio, o ex-secretário de Relações Institucionais e delator do esquema, Durval Barbosa, ex-secretários de estado, deputados distritais e o conselheiro licenciado do Tribunal de Contas do DF Domingos Lamoglia.
Mesmo afastado do Tribunal de Contas desde dezembro de 2009, Lamoglia mantém o foro privilegiado. A prerrogativa do conselheiro é que levou a denúncia para o STJ, na medida em que os demais envolvidos que tinham foro perderam seus cargos por conta do escândalo.
Gurgel não adiantou os nomes dos ex-deputados distritais denunciados, entretanto, confirmou que todos os parlamentares flagrados nos vídeos de Barbosa, entre eles Leonardo Prudente, Júnior Brunelli e Eurides Brito, são alvo da denúncia.
Prudente ficou conhecido por aparecer em vídeo guardando dinheiro nas meias. Brunelli aparece em outra filmagem comandando a "oração da propina", em que ele faz oração logo após receber dinheiro de Durval Barbosa.
Por meio de nota, Paulo Octávio afirmou ter recebido "com surpresa" a denúncia. "Recebo com surpresa a notícia que o procurador-geral incluiu meu nome na denúncia apresentada ao STJ. Não há nenhuma prova contra mim, não fui apontado no relatório elaborado pela Polícia Federal e tenho convicção de que esta peça não vingará quando for analisada pela Justiça."
O G1 entrou em contato com Domingos Lamoglia e com a advogada de Durval Barbosa, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
Segundo Gurgel, os suspeitos foram enquadrados, basicamente, nos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
A denúncia
Com 180 páginas, a denúncia relata com detalhes como operavam os integrantes da suposta organização criminosa. Segundo Gurgel, os operadores do esquema teriam “inovado” ao introduzir na administração pública o “reconhecimento de dívida”.
De acordo com a PGR, um decreto publicado por Arruda teria permitido a realização de pagamentos pelo governo do DF mesmo sem que fosse comprovada a prestação de serviços. O método, complementou Gurgel, teria assegurado contratações com dispensa de licitação, principalmente de empresas do setor de informática.
“Era um negócio fantástico. Por exemplo, você conhece uma pessoa que é dona de uma empresa, aí afirma no despacho que essa empresa vem prestando serviços de limpeza para o governo. Não é necessário que ela tenha prestado esse serviço, desde que várias pessoas afirmem que ela vem prestando. Com isso, foi possível pagar valores extremamente generosos, obtendo futuramente a contrapartida”, relatou Gurgel.
A denúncia da Procuradoria também detalha a partilha do dinheiro desviado dos cofres públicos. Conforme o procurador-geral, Arruda recebia 40% da propina, Paulo Octávio 30%, e os secretários de estado, 10%. A fatia, porém, variava de acordo com cada contrato, enfatizou Gurgel.
O procurador-geral enviou para o STJ, junto com a denúncia, 70 caixas com documentos que demonstrariam como a quadrilha liderada por Arruda atuava. Caberá ao ministro Arnaldo Esteves Lima, relator do inquérito da Caixa de Pandora no STJ, analisar as alegações da Procuradoria-Geral.
Após averiguar a denúncia, Lima encaminhará seu relatório para apreciação da Corte Especial do tribunal. Caberá ao colegiado decidir se será aberta ação penal contra os 37 denunciados por Gurgel. Somente se a Corte acatar a denúncia, é que os suspeitos passam a ser réus.
Figura 'central'
Na ótica dos procuradores, o ex-secretário de Relações Institucionais do DF Durval Barbosa teria sido uma “figura absolutamente central” no esquema. Apesar de ter feito acordo de delação premiada com a Justiça, o delator do escândalo também foi denunciado pela PGR.
Gurgel afirmou que os acordos feitos em troca de informações “não afastam a possibilidade de denúncia”.
“Nunca fazemos acordos de delação que impliquem em afastar as responsabilidades, sobretudo, quando a pessoa tem uma participação central”, ressaltou o procurador-geral.
Antes de Arruda assumir
A apuração do Ministério Público Federal confirmou, como já evidenciavam os vídeos divulgados por Durval Barbosa, que o esquema de cobrança de propina teria sido implantado antes mesmo de Arruda assumir o governo do Distrito Federal.
Gurgel revelou que uma parte da denúncia apresentada ao STJ cita o ex-governador Joaquim Roriz (PSC-DF). Ele, no entanto, não foi incluído na lista de denunciados. O procurador-geral justificou que, em razão da "idade avançada" do ex-governador, os supostos crimes atribuídos a ele já prescreveram. Roriz tem, atualmente, 75 anos.
“O que se coloca na denúncia é em torno do ex-governador Arruda. Evidentemente, não se afasta que o esquema teria começado antes. Pela prova colhida, tivemos que nos ater ao período anterior às eleições e à gestão do governador Arruda”, disse Gurgel.
Caixa de Pandora
A acusação da Procuradoria-Geral da República estava sendo elaborada desde abril de 2010, quando a Polícia Federal entregou o inquérito da Operação Caixa de Pandora ao STJ. O procurador-geral tentou explicar por que a denúncia levou mais de dois anos para ser apresentada à Justiça. Segundo ele, o MPF teve de promover investigações próprias para amarrar pontos abertos na apuração dos policiais federais.
“No relatório da Polícia Federal, nenhum deputado distrital era indiciado. O que mostra que precisávamos trabalhar muito”, justificou.
A operação Caixa de Pandora foi deflagrada pela Polícia Federal em novembro de 2009 e investigou o suposto esquema de pagamento de propina no governo do Distrito Federal.
Segundo a Justiça, Durval Barbosa disse em depoimento que parlamentares da base aliada ao ex-governador receberam R$ 420 mil para a aprovação do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT).
Arruda chegou a ser preso, deixou o DEM para não ser expulso e foi cassado pela Justiça Eleitoral. Paulo Octávio, então vice, renunciou ao cargo para defender-se das acusações.
Durante meses, o DF esteve ameaçado de intervenção federal, em razão do suposto envolvimento de deputados distritais, integrantes do Ministério Público e do Executivo com o esquema denunciado por Durval Barbosa.
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