56 COMPROMISSOS: Carta da Caatinga é apresentada no evento
Rio de Janeiro. Mais importante do que a capacidade de mudar o texto da Rio + 20 é o estímulo às reflexões sobre as questões locais. Daí, os gestores estaduais de meio ambiente do Nordeste constituíram um fórum, no sentido do fortalecimento da governança nas políticas voltadas ao Desenvolvimento Sustentável do bioma Caatinga, com a primeira reunião agendada para o início do segundo semestre em Mossoró (RN).
Esses foram alguns dos destaques na fala de Paulo Henrique Lustosa, presidente do Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente do Estado do Ceará (Conpam), que apresentou, em nome de todos os gestores estaduais de meio ambiente do Nordeste, no fim da tarde de ontem, a Carta da Caatinga, no Parque dos Atletas, ao lado do Riocentro, onde se realiza a Rio + 20.
Em evento paralelo, o Encontro de Secretários de Meio Ambiente dos Estados e Municípios foi promovido pela Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) e Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (Anamma).
Conferência regional
Coube ao presidente do Conpam sintetizar esse esforço que resultou na Carta da Caatinga, com 56 compromissos firmados e mais os compromissos individuais dos Estados, resultantes da I Conferência Regional de Desenvolvimento Sustentável do Bioma Caatinga - A Caatinga na Rio + 20, realizada nos dias 17 e 18 e maio, na sede do BNB, em Fortaleza.
"Em todos os nove Estados que compõem o bioma Caatinga foram feitas conferências para discussões, não apenas de problemas, mas de vocações, belezas, envolvendo todos os atores interessados em deixar de ser um bioma marginalizado para ser um bioma estratégico", destacou o gerente do Ambiente de Políticas Territoriais, Ambientais e de Inovação do Banco do Nordeste (BNB), Carlos Alberto Pinto Barreto.
Ele enfatizou que o principal compromisso foi o de fomentar as forças por meio de uma proposta de emenda constitucional que transforme a Caatinga em patrimônio nacional e também a aprovação da Política Nacional de Combate e Prevenção à Desertificação e Mitigação dos Efeitos das Secas.
Paulo Henrique Lustosa falou também sobre as belezas e potenciais do bioma e de compromissos com esforços de mitigação dos efeitos da seca, tarefa que considera complexa por estar associada ao desenvolvimento sustentável, "isso vai implicar em necessidade de investimento em medidas para transferência de tecnologias apropriadas, que podemos intercambiar tanto no Brasil quanto em outros países".
Lustosa destacou que esse bioma, historicamente visto como pobre, a cada dia é mais visto por sua riqueza e beleza e são necessárias ações para valorizar isso. "Precisamos atuar no sentido da criação do Fundo Caatinga e de outros fundos verdes que beneficiem o bioma", disse.
Sobre a Rio + 20, afirmou que as discussões são pautadas por conferências anteriores e seus resultados incluem a Convenção de Combate à Desertificação e a Convenção da Biodiversidade, dois caminhos para falar das terras áridas e da proteção da biodiversidade. Lustosa inclui aí a dimensão socioeconômica, inserida na discussão da Economia Verde inclusiva.
"O desafio é encontrar alternativas para promoção do uso sustentável, evitando práticas inadequados que degradam o ambiente", destacou Francisco Campello, coordenador do Departamento de Combate à Desertificação da Secretaria de Extrativismo de Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Outros gestores ambientais do semiárido se manifestaram, como o de Minas Gerais, que anunciou a criação da maior unidade de conservação do Estado, com 500 mil hectares. O da Bahia falou sobre segurança alimentar e hídrica e do programa Água para Todos, que tem cerca de 2 milhões de beneficiados.
A presidente da Fundação Bernardo Feitosa, de Tauá, Sertão dos Inhamuns, Dolores Feitosa, disse, na ocasião, que fica esperançosa, considerando que o bioma Caatinga foi "muito humilhado" no passado. "Quem se interessa pela Caatinga tem que participar para não deixar que as promessas sejam esquecidas".
Falta de consenso seria "fracasso"
Rio de Janeiro. O diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável, Assuntos Econômicos e Sociais da Rio+20, Nikhil Seth, disse que se não houver consenso em torno do texto final, a conferência será considerada um fracasso internacional. A declaração foi dada ontem, no Riocentro, onde acontecem as negociações em torno do documento.
"Todos estão envolvidos em criar o futuro que queremos. Se, hipoteticamente, não se chegar a um acordo, isso será um fracasso coletivo, do sistema internacional", afirmou Seth.
O diretor disse, no entanto, que está otimista de que haverá um consenso em torno do documento e que esse será um bom texto. "O fato de termos um texto que nos dará uma direção para onde devemos ir já é uma boa conquista", afirmou.
O secretário-geral da Rio+20, Sha Zukang, disse acreditar que a disposição das delegações em trabalhar duro em torno do documento para conclui-lo ontem seria bem sucedida. "Delegados concordaram que o Brasil produziu um texto coerente e consolidado", afirmou.
Para o ministro do Meio Ambiente da Alemanha, Peter Altmeier, o texto traz avanços substanciais, mas ainda há espaço para melhorá-lo. Segundo ele, o documento poderia ser ambicioso, no que se refere aos oceanos.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, reforçou a tentativa do Brasil de negociar o texto sobre os meios de implementação dos objetivos da Rio+20, que tratam de transferência de tecnologia e recursos. Segundo Izabella, os brasileiros estão trabalhando duro para conciliar interesses, ouvindo todos os participantes da conferência.
Os negociadores têm que fechar o documento-base antes da reunião de cúpula dos chefes de estado, que começa amanhã.
"A discussão sobre os meios de implementação está ganhando outros contornos. (Os negociadores) estão redigindo um texto, ele está sendo objeto de consenso. Vamos ver como fica o processo de negociação em torno desse texto", disse Izabella.
Apelo por mudanças
O grupo chamado The Elders (os anciãos), formado em 2007 por iniciativa do ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, fez na tarde de ontem um apelo dramático para que os líderes atuais salvem o texto final da Rio+20.
"Os delegados não parecem entender a importância da justiça social e da inclusão social", disse Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda e ex-alta comissária da ONU para os Direitos Humanos.
"Ainda há tempo para os líderes tomarem as decisões corretas para implementar a mudança necessária para o benefício das novas gerações", afirmou Gro Harlem Brundtland, ex-premiê da Noruega.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995- 2002), que também falou na Rio+20 como integrante do grupo The Elders, disse que os governos não devem ter medo de sacrificar sua popularidade se for para tomar decisões que "digam respeito ao interesse futuro de seus países e da humanidade".
Numa referência indireta ao governo Dilma, ele pediu menos investimentos em combustíveis fósseis e mais em energia limpa.
A jornalista viajou pelo programa de bolsas da Internews / O Eco
MARISTELA CRISPIM
EDITORA DE REPORTAGEM ESPECIAL
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