Comércio bilateral, Brics, Mercosul: as razões por que o governo brasileiro acompanha de perto a eleição na Argentina
O Brasil precisa da Argentina e a Argentina precisa do Brasil, disse Lula
Por Filipe Matoso, Ana Paula Casto, TV Globo e GloboNews — Brasília
Sergio Massa (esquerda) e Javier Milei disputam segundo turno das eleições presidenciais na Argentina neste domingo (18) — Foto: JUAN MABROMATA, Tomas CUESTA / AFP
Argentinos vão às urnas neste domingo para escolher entre o peronista Sergio Massa e o economista ultraliberal Javier Milei. Lula disse na semana passada que a Argentina precisa de um presidente que goste da democracia.
O governo brasileiro se interessa e acompanha de perto a eleição presidencial da Argentina, marcada para este domingo (19). Alguns dos motivos para essa atenção são o comércio bilateral entre os dois países, a entrada da Argentina no Brics e a importância do país vizinho na estrutura do Mercosul.
Os candidatos que disputam o segundo turno são o peronista Sergio Massa, atual ministro da Economia, e o economista Javier Milei, ultraliberal que se define como um anarcocapitalista.
O governo brasileiro não diz publicamente com todas as letras, mas prefere que Massa ganhe. As posições ideológicas dele são mais aproximadas com as do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e um governo do atual ministro da Economia manteria as boas relações entre Brasília e Buenos Aires, retomadas com a volta de Lula ao poder.
Mas o presidente brasileiro não quer se comprometer abertamente, para não derrubar pontes no caso de vitória de Milei.
"O Brasil precisa da Argentina e a Argentina precisa do Brasil. Dos empregos que o Brasil gera na Argentina e dos empregos que a Argentina gera no Brasil, do fluxo comercial entre os dois países e de quanto nós podemos crescer juntos", afirmou Lula na última semana.
"Para isso é preciso ter um presidente que goste de democracia, que respeita as instituições, que goste do Mercosul, que goste da América do Sul e que pensa na criação de um bloco importante", completou Lula.
Para o embaixador Marcos Azambuja, ex-secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores e conselheiro emérito do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), Brasil e Argentina têm uma relação "virtuosa" que precisa ser mantida, independente do resultado das eleições.
“O Brasil tem que reconhecer quem quer que seja o candidato [vencedor das eleições na Argentina], tem que respeitar a escolha e agir de maneira prudente, para que a política seja de aproximação, não de confronto”, disse o embaixador.
Veja abaixo os motivos que tornam a eleição na Argentina importante também para o Brasil.
Parceria comercial
De janeiro a outubro deste ano, as exportações brasileiras para a Argentina somaram US$ 14,9 bilhões. Isso corresponde a 5,3% do valor total exportado pelo Brasil no período.
Para comparação, esse valor é superior às exportações brasileiras no período para o Oriente Médio (US$ 12,2 bilhões) e para a África (US$ 10,8 bilhões).
Além disso, a Argentina responde por 40% das exportações brasileiras para a América do Sul (US$ 37 bilhões) e quase 73% das remessas para o bloco do Mercosul (US$ 20,5 bilhões).
Principais produtos exportados para os argentinos entre janeiro e outubro:
Soja
Partes e acessórios de veículos automotivos
Veículos automóveis de passageiros
Energia elétrica
Minério de ferro e seus concentrados
“O Brasil tem interesse permanente em uma Argentina próspera e Argentina em um Brasil forte. Os dois têm interesse porque a vantagem é recíproca. Quando o Brasil enriquece, compra mais, viaja mais, nós temos uma relação virtuosa", explicou.
No caso das importações, a Argentina fica em quarto lugar no ranking de países que mais vendem para o Brasil.
Entre janeiro e outubro, o Brasil importou US$ 10,2 bilhões da Argentina - 5% do valor total importado pelo Brasil no período.
Entre os itens mais importados do país vizinho, estão:
Veículos automóveis para transporte de mercadores e usos especiais
Veículos automóveis de passageiros
Eleições na Argentina: Massa e Milei disputam segundo turno
Mercosul
Lula defende o fortalecimento do Mercosul, grupo que reúne Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai. Em sua concepção original, o Mercosul previa uma progressiva derrubada de barreiras para circulação de produtos, dinheiro e pessoas, em prol da integração e do desenvolvimento regional. O grupo, no entanto, vem enfrentando dificuldades nos últimos anos, em razão de crises econômicas e divergências de seus membros.
No entendimento do governo brasileiro, o avanço do Mercosul ainda é uma alternativa valiosa para o crescimento das economias do continente.
Não é o que pensa Milei. Após as primárias de agosto, o candidato afirmou que o Mercosul "deve ser eliminado" e que vai priorizar relações com Estados Unidos e Israel.
Fontes da diplomacia brasileira afirmam que o governo quer ver concluído, no início de dezembro, o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. As negociações se arrastam há anos. Para o governo, o ideal seria anunciar o acordo na cúpula do Mercosul, que ocorrerá nos dias 6 e 7 de dezembro. A posse do novo presidente da Argentina vai ser no dia 10.
A pressa tem a ver com uma eventual vitória de Milei. Diplomatas temem que, nesse caso, o acordo fique estagnado.
A Argentina é um dos países que passarão a integrar o grupo dos Brics a partir de janeiro de 2024.
O grupo foi fundado em 2006, com Brasil, China, Rússia e Índia, consideradas algumas das principais economias emergentes do mundo. O presidente Lula estava então em seu primeiro mandato e participou ativamente da criação do grupo.
Depois, em 2011, o Brics passou a contar com a África do Sul. Em agosto de 2023, foram convidados outros 5 países, além da Argentina, que entrarão no Brics no ano que vem:
Egito
Irã
Etiópia
Arábia Saudita
e Emirados Árabes Unidos
Para Lula, que busca investir em estreitar laços com as economias em desenvolvimento, e não só com os países mais ricos do mundo, é importante que os integrantes dos Brics tenham pensamento parecido com relação aos objetivos do grupo. Se Milei passar a fazer parte dos líderes dos Brics, o bloco pode perder força.
https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/11/19/comercio-bilateral-brics-mercosul-as-razoes-por-que-o-governo-brasileiro-acompanha-de-perto-a-eleicao-na-argentina.ghtml
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