América Latina busca modelos europeus de combate às drogas

A América Latina é a maior produtora mundial de cocaína e maconha.

Reuters

Países latino-americanos estão se voltando para modelos europeus na luta contra abuso de narcóticos, após décadas de uso do estilo do violento e dispendioso da guerra às drogas liderado pelos EUA.

Até recentemente, a maioria dos países latino-americanos mostravam tolerância zero sobre drogas, inspirados pelos EUA. Mas agora os países do Brasil e Guatemala estão explorando penas alternativas para uso pessoal de drogas, seguindo exemplos como Espanha e Portugal, que canalizaram recursos para prevenção em vez de prisões.

A América Latina é a maior produtora mundial de cocaína e maconha, alimentando a enorme demanda nos EUA e Europa. O uso de drogas doméstico aumentou e a violência das gangues de drogas tem causado uma carnificina por décadas na fronteira México-EUA e nas favelas brasileiras.

Na quinta-feira (15), o Congresso uruguaio deu mais um passo no sentido de colocar o estado responsável pela distribuição de maconha legal. No mesmo dia, um parlamentar de esquerda no México apresentou um projeto de lei para legalizar a produção, venda e consumo de maconha.

Embora o projeto mexicano seja improvável de acontecer, ele reflete o crescente debate sobre como combater o uso de drogas em um país onde 60 mil pessoas morreram desde 2006 em disputas territoriais entre traficantes de drogas e confrontos entre cartéis e forças de segurança.

Mesmo sendo a maior produtora mundial de cocaína, a Colômbia, parceira dos EUA em campanhas de erradicação das drogas e com uma dos mais duras leis antidrogas na América Latina, está mudando. O presidente colombiano, Juan Manuel Santos, disse na quinta-feira que valia a pena explorar o modelo português, uma das políticas antidrogas mais liberais do mundo. "A experiência com as políticas de consumo de drogas é muito interessante para nós. Todo o mundo está à procura de novas maneiras de lidar com o problema. Espero aprender mais e mais sobre a experiência", disse ele em visita à Lisboa.

Portugal descriminalizou todas as drogas em 2001 para combater um problema sério de heroína que causou um surto de aids entre usuários de drogas. A mudança tem sido aclamada como uma história de sucesso, com os níveis de consumo caindo abaixo da média europeia. A Espanha, onde o consumo de drogas aumentou na década de 1980 após o fim da ditadura de Franco, tentou lutar contra o uso de cocaína, enfatizando os programas de tratamento para viciados. "Enquanto em nossos países um camponês é perseguido e preso por cultivar meio hectare, em dois estados dos EUA agora você pode simplesmente plantar quantidades industriais de maconha e vendê-los com liberdade completa. Nós não podemos fechar os olhos a este enorme desequilíbrio", disse o presidente mexicano, Felipe Calderón, à Cúpula Ibero-Americana neste sábado (17).

Calderón, cuja repressão militar aos cartéis de drogas desencadeou uma onda de violência no México, expressou cansaço com a demanda de Estados Unidos e Europa para reduzir o uso de drogas, dizendo que os consumidores de drogas dos EUA só alimentaram a guerra às drogas do México.

O secretário-geral Ibero-Americana Enrique Iglesias disse que há consenso na América Latina de que a guerra contra as drogas não estava funcionando, o que tem levado a novas abordagens para o problema. Colômbia, Peru e Bolívia produzem a maior parte da cocaína do mundo. México e Paraguai são os dois maiores produtores de maconha do mundo, com o último em grande parte fornecendo para Argentina, Brasil e Uruguai.

A mudança de pensamento latino-americana sobre as drogas remonta a um relatório de 2009 feito pelos ex-presidentes do Brasil, Colômbia e México, que disse que bilhões de dólares derramados em quatro décadas de esforços liderados pelos EUA de erradicação de culturas tinham apenas levado o consumo de drogas de uma região para outra. Há dez anos, os Estados Unidos poderiam ter reagido com alarme para a mudança na América Latina. Mas a administração Obama se absteve de criticar abertamente as mudanças nas leis de drogas, em parte porque as atitudes dos EUA também estão mudando.