Brasileiras denunciam discriminação no sistema de saúde de Portugal

A brasileira Maria Eduarda, de 20 anos, fala português, mas, segundo ela, não é o que pensa a médica que a atendeu

Por Gian Amato

Mulher caminha no centro de Lisboa Patrícia de Melo Moreira/AFP

Elas têm se mobilizado em grupos e associação para revelar problemas durante a gestação e casos de xenofobia no SNS, que faz 43 anos hoje

A morte de uma mulher indiana grávida durante transferência de hospitais em Lisboa motivou o pedido de demissão da ministra da Saúde, Marta Temido.

Assustadas, brasileiras têm se mobilizado nas redes sociais para evitar que a tragédia se repita e exigir tratamento igual no atendimento médico do Sistema Nacional de Saúde (SNS), que completa 43 anos hoje.

A indiana, que não teve seu nome revelado, tinha 31 anos, estava de férias em Portugal com o companheiro e não falava português ou inglês.

A brasileira Maria Eduarda, de 20 anos, fala português, mas, segundo ela, não é o que pensa a médica que a atendeu. Entre idas e vindas no Hospital de Cascais, nas quais lidou com a falta de vagas, a bolsa estourou, mas o líquido era marrom, como descreveu à “CNN”. Nesse momento, uma médica foi xenófoba, de acordo com Maria:

— Eu falei “olha, eu tive um corrimento marrom”. Ela disse: “Desculpa, mas aqui falamos português. Isso não é marrom. É castanho”. Perguntou a minha nacionalidade. (…) A pessoa está num momento difícil e vem dizer para eu falar português? Por quê? Para que vir procurar a minha nacionalidade? O que é que isso ia mudar?

Ela denuncia negligência e xenofobia no Hospital de Cascais. Foi seis vezes à emergência em 15 dias sem ser internada. Helena, sua filha, nasceu sem sinais vitais após cesariana de emergência e precisou ser reanimada. Luta pela vida numa UTI.

A produtora Isabel Maria Vieira faz parte de um grupo onde relatos se multiplicam. E relata o que tem sido publicado.

— Ando assustada com relatos no meu grupo. Negligência, descaso, forma de tratar com superioridade, falta de médicos… E não só no sistema público, no particular também. Li um relato absurdo sobre negligência de uma ginecologista. A paciente poderia ter morrido, mas foi salva por outro médico — disse Vieira.

As experiências nos hospitais com a sua mãe também têm assustado Vieira:

— Minha mãe está idosa e tenho medo dela adoecer e ser maltratada. Mais de uma vez chegamos às 17h30h e fomos atendidas às três da manhã. Ela estava passando mal, com dores, e sem medicação.

Ao comentar os problemas numa rede social, Vieira, que tem cidadania portuguesa, teve como resposta o seguinte comentário de um homem: “Paga um seguro e vai ao particular ou então volta para o teu país”.

Brasileiras e africanas dos países de língua portuguesa fundaram a Saúde Das Mães Negras (Saname) em 2020, mas o grupo foi formalizado agora como associação. O objetivo é fazer propostas e cobrar soluções do governo e do novo ministro da Saúde, Manuel Pizarro.

Com base em dados da Direção Geral da Saúde, informam que a taxa de mortalidade materna avança rapidamente entre as mulheres imigrantes, vistas, segundo o grupo, com preconceito. Após uma pesquisa com negras e afrodescendentes, a Saname descobriu casos de racismo no parto.

“Tendo em conta o desenvolvimento da medicina em pleno século XXI, acreditamos que algumas das mortes poderiam ser evitáveis. Lamentamos também o estado atual dos serviços de obstetrícia, as mulheres estão ansiosas e com muito medo dos nossos serviços no Sistema Nacional de Saúde. Queremos saber como estão a lidar com o fato de 1/4 das mortes maternas serem mulheres dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e do Nepal e Índia. O que tencionam fazer para prevenir e diminuir estas mortes?”.

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