Copom sobe Selic a 13,75% ao ano e indica ciclo de alta próximo de acabar
A sequência atual de altas começou em março de 2021, e já são 12
Imagem ilustração via redes sociais
Comitê de Política Monetária do Banco Central respeitou o script sinalizado na última reunião, repetindo a dose do último ajuste
Por Gustavo Ferreira, Valor Investe
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) subiu nesta quarta-feira (3) a meta para os juros básicos (Selic) a 13,75% ao ano. Aplicou, portanto, o plano de voo mais agressivo entre os dois possíveis anunciados na última reunião. Ou seja, subiu a taxa de referência em meio ponto, e não em menor medida como foi cogitado.
A decisão da autoridade monetária foi unânime e alinhada às expectativas de consenso do mercado para esta noite. E veio ainda um sinal aguardado pelo mercado. De acordo com o comitê, será avaliada "a necessidade de um ajuste residual, de menor magnitude, em sua próxima reunião". Ou seja, não está cravado que esta alta foi a última. Mas pode ter sido, salvo ainda um novo ajuste, de 0,25 ponto, se mostrar necessário em setembro.
Ou seja, a alta desta noite pode ter sido a última. Ou não. E tende a ser a próxima.
"Agora os investidores ficam no aguardo da ata do Copom na semana que vem", diz Cassiano Konig, sócio-fundador da GT Capital, para quem não deve vir um aviso textual de fim do ciclo de elevação da taxa de juros. "Então, acredito em mais uma ou duas altas até o fim do ano devendo fechar em 14%."
"No comunicado, o BC deixa claro que seu principal objetivo é consolidar não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas", diz Vinicius Romano, analista de Renda Fixa da Suno. "Além disso, o Copom destaca que a incerteza da atual conjuntura, aliada ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional em sua atuação.
A sequência atual de altas começou em março de 2021, e já são 12. A maior sequência ininterrupta de apertos. No entanto, sem conseguir trazer a inflação para dentro da meta.
Em 2021, quando o alvo era 3,75% ao ano, foi estilhaçado o teto de tolerância, de 5,25%. Inflação anual acima de 10%. Neste ano, a meta está nos 3,5%, e o teto, em 5,00%. O mercado estima que ficará acima de 7% ao ano.
Mas, do ponto de vista do BC, pouco importam agora esses números. A autoridade monetária já se deu por vencida, novamente. E tenta evitar que, de novo, falhe na missão em 2023. E falhará, se as contas dos analistas do mercado estiverem corretas.
As perspectivas de inflação para o "horizonte relevante da política monetária", 2023, estão subindo há 17 semanas seguidas. No momento, estima-se inflação rodando acima dos 5% no próximo ano. O teto da meta é de 4,75%.
Com os 13,75% ao ano, a Selic aprofunda sua viagem no universo dos dois dígitos, abandonado em 2017 e retomado em janeiro. O mesmo nível de 13,75% de dezembro de 2016.
Naqueles tempos, vale lembrar, o Brasil começava a tirar o pé da recessão, com o consumo devagar quase parando sob alto nível de desemprego. Adicionalmente a essa pressão natural de baixa nos preços, o teto de gastos acabava de ser erguido. Ao trazer mais previsibilidade e algum controle sobre a trajetória do endividamento público, a sensação de risco fiscal, então gritante, foi reduzida. O que, por sua vez, também permitia à Selic habitar patamares mais civilizados.
Mas, de lá para cá, como se sabe, muita água rolou. Veio uma pandemia. A partir de 2020, o mundo inteiro passou a lidar com descompasso inédito entre oferta e demanda. A retomada veloz das grandes economias, na base de incentivos fiscais, mantém a demanda no planeta em níveis muito acima do que os gargalos de produção ainda não superados poderiam suprir. E o resto é história.
Não bastasse a inflação importada, o Brasil é proficiente em caçar problema. Diante da necessidade de custear o socorro à população, nada de cortar ou remanejar despesas. A escolha foi espalhar diversos furos no teto de gastos até chegar na implosão total, no fim de 2021. Já neste ano, na ânsia eleitoral, novos dribles na Constituição foram dados.
Nessas condições, o BC acaba sendo levado a subir os juros até acima do nível do risco, na tentativa de evitar a fuga do dólar e a consequente alta de seu preço em reais.
Melhores aplicações em 2021
Do ponto de vista do consumo, Selic mais alta implica empréstimos e financiamentos mais caros.
Para o mercado financeiro local, a renda fixa pagando melhor significa menor poder de relativo de sedução para a renda variável. Já para o internacional, a renda fixa no Brasil passa oferecer retorno pouco mais alinhado à sorte de riscos oferecidos pelo país. Mais dólares podem ser atraídos ou menos afugentados. O que, por sua vez, vai na direção de controlar o canal cambial da inflação.
LEIA A ÍNTEGRA DO COMUNICADO
Em sua 248ª reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 13,75% a.a.
A atualização do cenário do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:
O ambiente externo mantém-se adverso e volátil, com maiores revisões negativas para o crescimento global em um ambiente inflacionário ainda pressionado. O processo de normalização da política monetária nos países avançados tem se acelerado, impactando o cenário prospectivo e elevando a volatilidade dos ativos;
Em relação à atividade econômica brasileira, o conjunto dos indicadores divulgado desde a última reunião do Copom seguiu indicando crescimento ao longo do segundo trimestre, com uma retomada no mercado de trabalho mais forte do que era esperada pelo Comitê;
A inflação ao consumidor continua elevada, tanto em componentes mais voláteis como em itens associados à inflação subjacente;
As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação;
As expectativas de inflação para 2022, 2023 e 2024 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 7,2%, 5,3% e 3,3%, respectivamente; e
No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de USD/BRL 5,30*, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). Esse cenário supõe trajetória de juros que termina 2022 em 13,75% a.a., reduz-se para 11,00% em 2023 e 8,00% em 2024. Supõe-se que o preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária "amarela" em dezembro de 2022, de 2023 e de 2024. Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 6,8% para 2022, 4,6% para 2023 e 2,7% para 2024. As projeções para a inflação de preços administrados são de -1,3% para 2022, 8,4% para 2023 e 3,6% para 2024. As projeções do cenário de referência incorporam o impacto das medidas tributárias recentemente aprovadas. Para o horizonte de seis trimestres à frente, que suaviza o efeito ano-calendário, mas incorpora os impactos secundários das medidas tributárias que incidem entre 2022 e o primeiro trimestre de 2023, a projeção de inflação acumulada em doze meses situa-se em 3,5%. O Comitê julga que a incerteza em torno das suas premissas e projeções atualmente é maior do que o usual.
O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais adicionais que impliquem sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local; e (ii) uma desaceleração da atividade econômica mais acentuada do que a projetada. O Comitê pondera que a possibilidade de que medidas fiscais de estímulo à demanda se tornem permanentes acentua os riscos de alta para o cenário inflacionário. Por outro lado, nota que o aumento do risco de desaceleração da economia global também acentua os riscos de baixa. O Comitê avalia que a conjuntura ainda particularmente incerta e volátil requer serenidade na avaliação dos riscos.
Notou-se que as projeções de inflação para os anos de 2022 e 2023 estavam sujeitas a impactos elevados associados às alterações tributárias entre anos-calendário. Assim, o Comitê optou neste momento por dar ênfase à inflação acumulada em doze meses no primeiro trimestre de 2024, que reflete o horizonte relevante, suaviza os efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora seus impactos secundários sobre as projeções de inflação relevantes para a decisão de política monetária.
Considerando os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 13,75% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2023 e, em grau menor, o de 2024. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
O Copom considera que, diante de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário continue avançando significativamente em território ainda mais contracionista. O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.
O Comitê avaliará a necessidade de um ajuste residual, de menor magnitude, em sua próxima reunião. O Copom enfatiza que seguirá vigilante e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas. Nota ainda que a incerteza da atual conjuntura, tanto doméstica quanto global, aliada ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional em sua atuação.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Fernanda Magalhães Rumenos Guardado, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso, Paulo Sérgio Neves de Souza e Renato Dias de Brito Gomes.
https://valorinveste.globo.com/mercados/moedas-e-juros/noticia/2022/08/03/copom-sobe-selic-a-1375percent-ao-ano.ghtml
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