Determinação judicial gera superlotação nas delegacias

Conforme a Portaria do juiz Luiz Bessa Neto, um preso só pode entrar no Sistema Penitenciário, quando dois saírem

DECISÃO POLÊMICA

No 34ºDP (Centro) existem duas celas com capacidade para abrigar oito presos cada uma, mas abriga, atualmente, 51 detentos
FOTOS: BRUNO GOMES/LUCAS DE MENEZES
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O juiz Bessa Neto disse que o Sistema não tem mais onde colocar presos
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O delegado Jairo Pequeno afirmou que Delegacia não foi feita para abrigar detentos
A determinação do juiz da Vara de Execuções Penais e corregedor dos Presídios, Luiz Bessa Neto, de que um preso só ingresse no Sistema Penitenciário do Ceará, quando dois saírem, está causando preocupação na Polícia Civil. A Polícia deverá custodiar dentro das delegacias os detentos que não conseguirem vagas nos presídios. A Portaria nº 001/2015, expedida no dia 16 de março de 2015, está sendo cumprida pela Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus), que diminuiu o número de vagas ofertadas, nesta última semana. Até ontem, 670 pessoas estavam nas carceragens da Polícia Civil. A decisão publicada por Bessa Neto no último dia 16 sugere ao secretário de Justiça que, "enquanto não for inaugurado a Unidade Prisional V, em Itaitinga, prevista para setembro do presente ano, que o provimento de vagas na estrutura carcerária, quando as houver, se operacionalize na proporção de um por dois, isto é, na medida em que dois internos se retirem do sistema de aprisionamento, apenas uma vaga poderá ser provida". O delegado geral da Polícia Civil, Andrade Júnior, afirmou que recebeu a Portaria com extrema aflição. "A Polícia não pode trabalhar desta forma, nós teríamos que parar de prender. Estes presos estão nas delegacias em situação muito pior que estariam nos presídios, além de causarem perigo à população, porque é como se tivéssemos pequenos presídios em cada bairro de Fortaleza", considerou. O delegado geral disse ainda, que solicitou patrulhas da PM para fazerem a segurança das delegacias, o que deve diminuir a operacionalidade das equipes. "As delegacias precisam ser seguras para que rebeliões, fugas e resgates sejam evitados. Infelizmente, muitas patrulhas que poderiam estar cumprindo seu papel vão ficar paradas ajudando na segurança destes presos". Para o delegado Jairo Pequeno, diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), a previsão é que o número de presos ultrapasse 800, até o feriado da Semana Santa. "Isto é um caos. Quero lembrar que essas pessoas estão à disposição da Justiça e não deveriam ser responsabilidade nossa custodiá-las. Delegacia não foi feita para preso cumprir pena". Jairo Pequeno revelou também que os presos do 12ºDP (Conjunto Ceará) se rebelaram, ontem, e impediram que mais gente entrasse na carceragem. Porém, a Delegacia em pior situação é o 34ºDP (Centro), onde existem duas celas, com capacidade para abrigar oito presos cada uma, e abriga, atualmente, 51 detentos. O delegado Romério Almeida disse que a tendência é que o problema se agrave. "Já temos 51 detentos em condições desumanas e degradantes, mas recebemos cerca de cinco procedimentos que terminam em prisão todos os dias. Será necessário improvisar um xadrez em alguma área da delegacia para acomodá-los", disse. Os detentos do 34ºDP reclamaram das condições em que estão sendo custodiados e disseram que querem ir para o presídio. Um dos presos está no local há 50 dias. Outro homem autuado por assalto disse que a Delegacia é o pior lugar para se estar preso. "Já estive sete vezes no presídio e posso garantir que nada é pior que isso aqui. A gente reveza a hora de dormir, porque não cabe todo mundo deitado. Tem gente doente, tem mosquito da dengue e todo mundo está com coceira", disse o infrator. Sem vagas O juiz Luiz Bessa Neto disse que tomou a decisão tendo em vista que o sistema carcerário do Ceará também não tem mais onde colocar detentos. "Temos vagas para 12 mil presos e recebemos quase 24 mil. Nosso excedente é de cerca de 80% na maioria das unidades e de 100% em uma das CPPLs. É necessário que se faça um amplo diagnóstico das deficiências carcerárias e se estabeleça um planejamento estratégico, para que a estrutura não tenha esse tipo de problema. Acredito que uma convergência entre as instituições com o Poder Legislativo, para elaborarmos uma saída, possa ser a solução". Para Bessa Neto a medida é uma forma de desafogar as unidades prisionais, que passam por um momento de total insalubridade. "Como magistrado estou cumprindo o que me diz respeito. Estou zelando pela lei e pela dignidade humana dos detentos. Sei que a Polícia também trabalha com dificuldades, mas nos presídios, o sistema está em compressão e pode precipitar uma explosão a qualquer hora". A Sejus informou, por meio de nota, que "reconhece a superlotação do sistema penitenciário cearense. Como se trata de decisão judicial, cabe à Sejus somente o cumprimento. A atual gestão, por outro lado, tem buscado alternativas ao encarceramento e articulado ações que visam reduzir a população carcerária". Márcia Feitosa Repórter