Líder comunitário vítima da Covid-19 deixa débito de R$ 13 mil e 250 pessoas ficam sem água no Crato

Bombeamento no poço profundo no Sítio Baixio dos Robertos foi interrompido, por falta de energia elétrica.

Legenda: Segundo moradores, a água foi cortada na última terça-feira (1º) Foto: Divulgação

Escrito por Antonio Rodrigues

A dívida era por conta do pagamento da energia elétrica, usada para bombear a água que abastece quatro famílias da zona rural de Crato. Moradores não sabem o paradeiro do dinheiro

Cerca de 238 famílias de quatro comunidades rurais do município de Crato, no Cariri cearense, tiveram o abastecimento de água interrompido, nesta semana, por inadimplência junto à Enel. Segundo os moradores, mesmo com o pagamento regular pelo Sistema Integrado de Saneamento Rural (Sisar), o bombeamento no poço profundo no Sítio Baixio dos Robertos foi interrompido, por falta de energia elétrica.

Segundo moradores, a água foi cortada na última terça-feira (1º). O presidente da associação comunitária, responsável pelo recolhimento do dinheiro e pelos vencimentos, morreu há um mês após complicações da Covid-19. A família não sabe o que aconteceu com os cerca de R$ 13 mil arrecadados.

O mecânico Ramon Amorim, um dos prejudicados, explica que a comunidade tem todos os comprovantes de pagamento, onde estão incluídos os serviços de abastecimento e energia elétrica da bomba. “De uma hora pra outra foi cortada. Fomos surpreendidos”, afirma. O morador garante que a comunidade não sabia que o Sisar fazia o repasse do valor recolhido ao presidente da associação de moradores, Francieldo Caetano, que faleceu em 14 de julho. 

“A gente tinha contato constantemente. Ele tirava os vazamentos, fechava a fatura. A população acredita que é uma forma de sonegar. A gente fazia o pagamento e terceirizava para uma pessoa física. Alguma coisa errada tem”, acredita Ramon.

Sisar

Por outro lado, a gerente Social do Sisar, Marília Queiroz Santana, explica que o gerenciamento é feito junto com as associações de forma compartilhada.

Segundo ela, o Sistema oferece apoio técnico, comercial e social para as comunidades filiadas. Já a associação local fica responsável por deliberar sobre a gestão do sistema. “Entre as atribuições da Associação, encontra-se receber do Sisar o arrecadado de taxa administrativa, ajuda de custo do operador e valor da energia. O presidente da entidade deve destinar corretamente cada um destes valores”, detalha.  

Santana explica que o presidente da Associação do Baixio dos Robertos - no caso, Francieldo, deveria pagar as contas de energia do sistema de abastecimento. O repasse é feito, preferencialmente, na conta bancária da entidade, mas, quando não há, pode ser depositado na conta pessoal do presidente, com assinatura dos diretores. Todos os documentos precisam ser autenticados em cartório.

Porém, de fevereiro a junho deste ano, nenhum boleto da Enel foi pago. “Ficamos surpresos. A comunidade é filiada ao Sisar desde 2007 e nunca tivemos problemas”, conta Marília.  

“Quando identificamos, em março, entramos em contato com ele, que ficou de resolver, mas logo em seguida teve Covid-19. Ele pediu um tempo, se afastou e logo ficou hospitalizado. Até que veio a óbito”, narra Marília. O Sisar entrou em contato com a família de Francieldo sobre os valores. Uma irmã do presidente da associação, que tinha acesso a conta, mostrou que o dinheiro havia sido sacado. “Eles ficaram de entregar o extrato e depois se negaram”, lamenta. 

Valores

Ao todo, entre fevereiro e junho, foram arrecadados e depositados na conta de Francieldo R$ 13 mil, mas o débito junto a Enel é de R$ 8.922,56. Para resolver a situação, o Sisar propôs pagar uma entrada de 30% e o restante ser dividido pelas famílias que são abastecidas. Sem apoio, ficaria em torno de R$ 58,50, diluídos em nove parcelas de R$ 6,50. Com o apoio do órgão, ficaria abaixo de R$ 3, mas isso não inclui os júros e multa.

A comunidade não aceitou. “A gente não aceita, porque já pagamos”, justifica Ramon.  

O Sistema Verdes Mares entrou em contato com um familiar do ex-presidente da associação, que pediu para não ser identificado. Ele disse que antes de falecer, Francieldo não havia informado nada à família e que eles mesmos encontraram várias contas da Enel em aberto. “A gente ficou preocupado e informou. Aí eles pediram para dar um jeito de entrar na conta e ver se esse dinheiro estava lá, mas não estava”, conta.

“Ele era muito fechado, na dele, não passou nada pra gente”, completa.  

A própria família de Francieldo também foi prejudicada com a falta d’água na comunidade. “Tem pessoas aqui com caixa, mas para quem não tem fica difícil. Tem que ficar pedindo aos vizinhos”, conta. “A gente está sem água pra tomar banho, lavar roupa e para higienizar, ainda mais em tempos de pandemia. Tem que pedir água para beber, cozinha”, completa Ramon.  

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