‘Não consigo gozar’: por que tantas mulheres têm dificuldade para atingir o orgasmo

Causas psicológicas que podem atrapalhar o orgasmo

Por Marcella Centofanti, Colaboração Para Marie Claire — São Paulo

Estima-se que aproximadamente 20% das mulheres sofram de anorgasmia — Foto: Foto de Ivan Babydov/Pexels

A anorgasmia é uma disfunção sexual caracterizada pela dificuldade de chegar ao clímax por pelo menos seis meses, de uma maneira que traga sofrimento para a pessoa

Diversas pesquisas já revelaram que muitas mulheres têm dificuldade para atingir o orgasmo. Uma delas, divulgada por Marie Claire, mostrou que somente 36% das brasileiras atingem o clímax durante o sexo. Para a maioria, a masturbação é o melhor caminho para chegar lá. Um número expressivo, no entanto, simplesmente não consegue gozar.

De acordo com a ginecologista e sexóloga Carolina Ambrogini, coordenadora do Projeto Afrodite, do Centro de Sexualidade Feminina da Unifesp, estima-se que 20% das mulheres tenham anorgasmia. Essa disfunção sexual caracteriza-se pela dificuldade de atingir o orgasmo por pelo menos seis meses, de uma maneira que traga sofrimento para a pessoa.

A anorgasmia tem três tipos. Ela pode ser primária, quando o indivíduo nunca alcançou o auge da relação sexual. Pode ser secundária, quando a pessoa já teve orgasmo, mas, por algum motivo, não consegue mais chegar lá. Também pode ser situacional. Nesse caso, a mulher só goza em situações específicas, como a masturbação.

“A anorgasmia pura ocorre quando a pessoa fica excitada, mas não consegue atingir o ápice do prazer”, explica a médica. “O orgasmo não acontece do nada. Ele é um reflexo medular. É como uma montanha que a pessoa escala até alcançar o topo, que a gente chama de platô orgásmico.”

A psicóloga e sexóloga Cristiane Yokoyama pontua que essa disfunção precisa ser tratada: “Uma mulher que consegue ter orgasmo e prazer na vida sexual eleva sua autoestima e previne a tristeza, a depressão e a ansiedade. O orgasmo é um excelente veículo para aliviar o stress”.

Causas físicas da anorgasmia

As causas da anorgasmia dividem-se entre físicas e psicológicas. No primeiro grupo, elas reúnem lesões medulares que interrompem a comunicação com o clitóris e doenças neurológicas e vasculares, como o diabetes avançado.

A diminuição significativa dos hormônios estrogênio e testosterona também pode levar à atrofia do clitóris, dificultando o orgasmo. O motivo mais comum, porém, é o uso de antidepressivos, um tipo de anorgasmia secundária.

Cristiane Yokoyama aponta ainda as dores crônicas — desencadeadas por moléstias como a enxaqueca e a fibromialgia — como uma barreira para o prazer. Abuso de drogas, lícitas ou ilícitas, também podem dificultar o clímax.

Causas psicológicas que podem atrapalhar o orgasmo

Já as causas psicológicas são preponderantes na anorgasmia. Carolina Ambrogini as separa em três categorias, sendo a primeira a falta de conhecimento, motivada por fatores como a família e a religião.

“Se a pessoa é inibida culturalmente, não se conhece. Ela vai para uma relação sexual sem ter nenhuma noção do próprio corpo e joga todo o prazer na mão da parceria. Na realidade, porém, o prazer é uma descoberta individual”, aponta a sexóloga da Unifesp.

Para a médica, indivíduos que sofreram traumas, abusos e violências também se enquadram nesse grupo. Lembranças negativas podem afetar a experiência do gozo.

A ansiedade é outra causa significativa. Mulheres ansiosas, focadas em pensamentos intrusivos, podem ter dificuldades em sentir o corpo e, portanto, em atingir o orgasmo. Elas estão tão preocupadas em gozar que não conseguem escalar a montanha do prazer até o cume.

A preocupação com o desempenho na cama também pertence a essa classe. A sociedade contemporânea, com suas expectativas performáticas, coloca pressão sobre as mulheres para atingirem orgasmos múltiplos e até mesmo ejacular.

O terceiro grupo é composto por indivíduos controladores, que têm dificuldade em se entregar ao momento de prazer.

“A mulher moderna é frequentemente sobrecarregada com expectativas sociais e pessoais, desde os papéis tradicionais até as pressões estéticas. Tudo isso contribui para a ansiedade e o stress, afetando diretamente a sexualidade”, diz a psicóloga.

Estratégias para combater a dificuldade de chegar ao clímax

Para lidar com a anorgasmia, Carolina Ambrogini recomenda que as mulheres invistam no autoconhecimento, explorando suas fantasias sexuais e entendendo o que as excita. Além disso, é crucial ter uma comunicação aberta com a parceira. A entrada na relação deve ser vista como uma oportunidade de troca e conexão afetiva, aliviando a pressão de atingir o orgasmo.

A importância de desfrutar o momento, sem a obrigação de alcançar o orgasmo, é destacada, especialmente para mulheres ansiosas. Estratégias como exercícios de meditação e mindfulness são sugeridas para permitir que as mulheres aproveitem a experiência sem ansiedade.

Cristiane Yokoyama destaca que, no corpo feminino, o orgasmo pode acontecer a partir do estímulo de várias regiões, não somente do clitóris.

“É claro que o caminho mais fácil de atingir o orgasmo é pelo estímulo da região clitoriana, por causa das terminações nervosas dali. Mas a mulher não precisa ficar somente presa à vulva e ao canal vaginal. Nós podemos ter orgasmo com massagem na parte interior da coxa, nos pés, no pescoço, na nuca, por exemplo”, afirma a psicóloga.

Ajuda profissional

Muitas pessoas hesitam em procurar ajuda para a anorgasmia. “Em uma sociedade na qual a sexualidade é tabu, as mulheres recorrem ao ginecologista em busca de orientação. No entanto, os colegas médicos investigam mais a saúde ginecológica e deixam de olhar para pontos importantes, como desejo, excitação, dor e orgasmo. A falta de questionamento sobre a saúde sexual durante consultas ginecológicas é uma lacuna que precisa ser preenchida”, diz Cristiane Yokoyama.

Segundo a psicóloga, se a paciente é diagnosticada com disfunção sexual pelo ginecologista, deveria ser encaminhada para um sexólogo: “Esse profissional vai poder entender com a paciente a causa da falta de orgasmo. A avaliação é subjetiva”.

O tratamento é muitas vezes baseado na terapia cognitivo-comportamental (TCC), com exercícios, trabalho de crenças e, em casos específicos, a avaliação de questões patológicas por médicos sexólogos. Fisioterapia pélvica também pode ser indicada. “O orgasmo é uma coisa boa da vida. A gente pode ter orgasmos múltiplos e diferenciados em relação ao tempo e à qualidade. Se você tem alguma questão com isso, você precisa se tratar”, recomenda a psicóloga.

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