Sentir dor durante a relação sexual é normal? Entenda o que pode causar o incômodo
A ginecologista Dra Nathalie Raibolt, mestre em saúde da mulher fala sobre o assunto
Por Alice Arnoldi, Colaboração Para Marie Claire — São Paulo
Em uma sociedade machista, patriarcal e religiosa, a mulher é colocada na posição de que deve aceitar tudo, até mesmo dor, para gerar uma vida — Foto: Pexels
Ainda que a dor sentida na penetração durante o sexo seja relatada por diversas mulheres, ela não deve ser normalizada. O incômodo pode surgir em decorrência de infecções e inflamações vulvovaginais, além de doenças ginecológicas e fatores psicológicos
Em uma conversa íntima entre amigas, não é incomum ouvi-las relatar sobre episódios de dor na relação sexual. Só que é importante saber que o incômodo durante o sexo não é normal. Ele tende a ser um indicativo de que algo não vai bem no organismo feminino.
A normalização da dor durante a relação sexual, como pontua a sexóloga Virginia Gaia, acontece principalmente por questões culturais e sociais que cercam o público feminino. “O sexo sempre foi colocado como algo cuja finalidade é a procraciação e, consequentemente, mulheres 'recatadas' não devem sentir prazer na relação sexual”, exemplifica.
Com essa raiz machista, patriarcal e até mesmo religiosa, a mulher é colocada na posição de que deve aceitar o que for para gerar uma vida, até mesmo dor. O que é um perigo, pois o incômodo no ato sexual pode indicar desde problemas pontuais no sexo até doenças crônicas.
Por que a dor durante a relação sexual acontece?
O incômodo durante o ato sexual, de forma pontual, pode vir a acontecer caso a mulher não esteja lubrificada o suficiente e com o assoalho pélvico relaxado para a penetração acontecer de forma prazerosa. Isso pode acontecer por falta de preliminares, de intimidade com o parceiro para sinalizar o que gosta ou não, inseguranças com o próprio corpo, entre outros motivos.
Quadros de infecções e inflamações vulvovaginais, como candidíase, também podem resultar em incômodos pontuais durante o ato sexual.
De acordo com a ginecologista Nathalie Raibolt, mestre em saúde da mulher e coordenadora da pós-graduação em sexualidade humana na Artmed e PUCPR, o ressecamento vaginal pode acontecer devido à queda do hormônio estrogênio. Isso ocorre principalmente durante a menopausa, mas ainda pode ser percebido em outros períodos da vida da mulher. A reposição hormonal é fundamental nesses casos.
“A dor na relação ainda pode acontecer por causa da vulvodínia (dor crônica na vulva) e do vaginismo, caracterizado pela contração involuntária da musculatura do assoalho pélvico, na possibilidade de penetração”, explica Nathalie Raibolt.
A ginecologista Flávia Fairbanks, secretária do comitê nacional especializado em sexologia da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), explica que outras doenças ginecológicas podem vir a causar o incômodo no ato sexual, como:
- Doença inflamatória pélvica (DIP);
- Endometriose;
- Adenomiose;
- Cistos nos ovários;
- Miomas no útero.
“Não devemos esquecer de causas não ginecológicas, que podem dar dor na relação sexual, como infecção urinária e constipação intestinal mais intensa”, completa a especialista.
A influência do emocional na dor na relação sexual
É verdade que a dor física no ato sexual também pode ter relação com o estado psicológico feminino e há uma explicação para isso.
“A excitação começa no cérebro. Os estímulos eróticos, sejam eles mentais, visuais, ou físicos, disparam a liberação de neurotransmissores, que informam a vulva e a vagina das mudanças que precisam acontecer nelas. Logo, todo trâmite psicológico vai interferir no processo de excitação”, esclarece Nathalie Raibolt.
Não por acaso, mulheres que enfrentam quadros de estresse muito intenso, depressão e ansiedade tendem a ter mais dificuldade para se relacionar sexualmente, como pontua Flávia Fairbanks.
Os reflexos sociais também influenciam o público feminino nesse processo. Não é incomum as mulheres flutuarem entre a culpa por estarem tendo relações sexuais e a dúvida de estarem perfomando na cama como os homens esperam, principalmente devido à comparação com a pornografia.
As duas situações geram inseguranças nas mulheres, dificultando o processo de se concentrar nas sensações de prazer sentidas no sexo, o que pode refletir em dor no ato devido a falta de lubrificação e relaxamento.
Quando é hora de procurar por ajuda médica?
As duas ginecologistas sinalizam que a mulher deve procurar por auxílio médico quando o incômodo no ato sexual se torna recorrente. “A partir de um segundo ou terceiro episódio sucessivo de persistência da dor é importante procurar ajuda e uma solução para um possível problema”, enfatiza Flávia Fairbanks.
A prática do ato sexual mesmo com dor não é recomendada porque, com o tempo, o organismo cria repulsa por tudo aquilo que causa incômodo a ele. Logo, a tendência é que a mulher vá diminuindo a frequência das relações sexuais até parar de tê-las por completo.
Nathalie Raibolt explica que a experiência sexual negativa persistente ainda pode piorar alguns casos, como o de vaginismo. “A contração muscular involuntária vai ficando mais estabilizada e cristalizada, sendo mais difícil trabalhá-la caso a mulher esteja há muito tempo repetindo essas experiências dolorosas”, exemplifica a ginecologista.
Além de tratar a causa da dor na relação sexual, é importante que a mulher passe a ter outras experiências sexuais, que não envolvam a penetração, mas que sejam prazerosas para que ela possa resignificar o que é o sexo para si.
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