Vacina da Pfizer: Brasil adota 3 meses entre doses, por que não segue indicação de 21 dias?
Ministério da Saúde informou em nota técnica que adota o mesmo intervalo usado no Reino Unido
Imagem ilustrativa crédito Olhar Digital
Intervalo da vacina da Pfizer: por que o Brasil adota 3 meses entre doses e não segue indicação de 21 dias?
Ministério da Saúde orientou estados e municípios a aplicarem a vacina com 12 semanas de intervalo. Esse, entretanto, não é o espaçamento recomendado pela fabricante. Segunda dose é essencial para garantir eficácia, alertam especialistas.
Por Lara Pinheiro e Mariana Garcia, G1
Que vacina é essa? Pfizer Biontech
O Ministério da Saúde começou a distribuir, nesta segunda-feira (3), 500 mil doses da vacina da Pfizer/BioNTech contra a Covid-19 às 27 unidades federativas. O número equivale a metade do total de 1 milhão de doses da vacina recebidas pelo Brasil na semana passada.
A pasta divulgou orientações aos estados e municípios para que apliquem as duas doses da vacina com 12 semanas de intervalo. Esse, entretanto, não é o intervalo recomendado pela Pfizer.
Em janeiro, a empresa afirmou que só pode garantir a eficácia da vacina se ela for dada com 21 dias de espaçamento entre as doses, conforme foi testada. O intervalo sugerido pela fabricante é o mesmo defendido pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A entidade admite uma ampliação para, no máximo, até 42 dias (6 semanas).
Para justificar a orientação de 12 semanas, o Ministério da Saúde informou em nota técnica que adota o mesmo intervalo usado no Reino Unido, que ampliou o prazo com base em estudos que constataram que o imunizante confere um certo nível de proteção mesmo com apenas uma dose:
Um dos estudos, feito justamente no Reino Unido, apontou para 80% de efetividade da vacina na redução do risco de hospitalização com apenas uma dose em idosos de 70 anos ou mais.
Uma segunda pesquisa, publicada em fevereiro na revista científica "The Lancet", apontou que a vacina reduziu em 75% a transmissão do coronavírus e de 85% dos casos sintomáticos de Covid menos de um mês após a aplicação da primeira dose. Na época, os autores destacaram que os resultados davam suporte à possibilidade de adiar a segunda dose em cenário de escassez de vacinas.
Um terceiro estudo apontou, ainda, que a transmissão da Covid-19 cai pela metade com apenas uma dose das vacinas da Pfizer ou da AstraZeneca/Oxford.
Para a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, atrasar a segunda dose pode ser uma boa estratégia – desde que ela esteja garantida.
"Com 80% de proteção para uma dose, pode ser uma política boa para o Brasil nesse momento, de vacinar o máximo de pessoas possível. Se for o caso de usar todas as doses e vacinar com essa proteção alta, de 80% para uma dose, poderia fazer sentido", avalia.
O Ministério da Saúde informou que disponibilizaria 500 mil das 1 milhão de doses recebidas pelo Brasil para a primeira etapa de imunização – mas não deixou claro se as outras 500 mil serão destinadas para completar o esquema vacinal ou se serão usadas em um novo grupo de primeira dose.
O que diz o Ministério da Saúde?
O ministério recomenda que a vacina seja dada com intervalo de 12 semanas. A pasta usou como base as recomendações do Reino Unido (veja detalhes mais abaixo).
Na nota técnica, o ministério cita estudos feitos nos Estados Unidos e Reino Unido, que apontam uma elevada efetividade após a primeira dose da vacina.
Um intervalo maior possibilita a vacinação do maior número possível de pessoas com a primeira dose e traz maiores benefícios do ponto de vista da saúde pública, argumenta a pasta.
O ministério explica que os dados epidemiológicos e de efetividade da vacina serão monitorados e que a recomendação pode ser revista. “Em cenários de maior disponibilidade da vacina, o intervalo recomendado em bula [21 dias] poderá ser utilizado”, completa a pasta.
O que diz a Pfizer?
Em janeiro, depois que o Reino Unido decidiu aplicar a vacina com 12 semanas de intervalo entre as doses, a Pfizer alertou que não poderia garantir a eficácia de seu imunizante com este intervalo.
O G1 entrou em contato com a Pfizer Brasil questionando os seguintes pontos à farmacêutica:
Qual intervalo a Pfizer considera mais adequado para aplicação das duas doses da vacina? 3 ou 12 semanas?
Considerando o cenário de falta de vacinas, a farmacêutica considera aceitável aplicar o imunizante com 12 semanas de diferença?
Se aplicada com 12 semanas, a vacina perde eficácia? A empresa garante resultados semelhantes aos vistos nos testes para este intervalo?
A assessoria da empresa no Brasil afirmou que entraria em contato quando tivesse um posicionamento da Pfizer global, mas, até a mais recente atualização desta reportagem, ainda não havia respondido aos questionamentos.
O que diz a bula?
A bula da farmacêutica, disponibilizada no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), orienta um intervalo maior ou igual a 21 dias (de preferência 3 semanas) entre a primeira e a segunda dose.
O documento alerta que a pessoa vacinada "pode não estar protegida até pelo menos 7 dias após a segunda dose da vacina".
O que diz a OMS?
Em uma sessão de "perguntas e respostas" em sua página on-line, atualizada no dia 20 de abril, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que as doses sejam dadas com um intervalo de 21 a 28 dias.
"Pesquisas adicionais são necessárias para entender a proteção potencial de longo prazo após uma única dose", afirma a entidade.
Segundo a OMS, um "efeito protetor" da vacina "começa a se desenvolver 12 dias após a primeira dose, mas a proteção total requer duas doses".
Em um manual divulgado em janeiro, entretanto, com orientações iniciais de como aplicar a vacina logo após a sua aprovação, a OMS recomendou que o intervalo entre as doses poderia ser estendido até 42 dias (6 semanas).
"Se houver dados adicionais disponíveis sobre intervalos mais longos entre as doses, será considerada a revisão desta recomendação", disse a entidade. O documento também considerava as restrições no fornecimento de vacinas enfrentadas por vários países:
"Os países que vivenciam circunstâncias epidemiológicas excepcionais podem considerar adiar por um curto período a administração da segunda dose como uma abordagem pragmática para maximizar o número de indivíduos que se beneficiam com a primeira dose, enquanto o fornecimento da vacina continua a aumentar. A recomendação da OMS no momento é que o intervalo entre as doses pode ser estendido até 42 dias (6 semanas), com base nos dados de ensaios clínicos atualmente disponíveis", dizia o texto, que ainda está disponível on-line.
Como a aplicação é feita em outros países?
Reino Unido
A recomendação é que a vacina seja dada em um intervalo mínimo de 21 dias.
Em seu manual de orientação sobre as vacinas, o governo britânico observa, entretanto, que, "operacionalmente, é recomendado que um intervalo consistente seja usado para todas as vacinas para evitar confusão e simplificar o registro".
Por isso, o documento pontua que "um cronograma de cerca de 12 semanas está sendo seguido para permitir que mais pessoas se beneficiem da proteção fornecida com a primeira dose durante a fase de implantação. A proteção de longo prazo será então fornecida pela segunda dose".
Segundo o manual, se um intervalo maior do que o recomendado for deixado entre as doses, a segunda dose ainda deve ser dada (de preferência usando a mesma vacina da primeira dose, se possível). Não é necessário reiniciar a vacinação.
Estados Unidos
O Centro de Controle de Doenças (CDC, na sigla em inglês) recomenda um intervalo de 21 dias entre as doses.
Israel
A vacina é dada com espaçamento de 3 semanas (21 dias) entre as doses.
Alemanha
O Comitê Permanente de Vacinação do Instituto Robert Koch, responsável por monitorar a pandemia e a vacinação na Alemanha, recomenda um intervalo de 6 semanas entre as doses das vacinas de RNA (tanto a da Pfizer quanto a da Moderna).
https://g1.globo.com/bemestar/vacina/noticia/2021/05/03/intervalo-da-vacina-da-pfizer-por-que-o-brasil-adota-3-meses-entre-doses-e-nao-segue-indicacao-de-21-dias.ghtml
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