Humanização é princípio que norteia a maternidade mais tradicional do Ceará

O perfil da maternidade é atender gestantes de diversos municípios do Ceará cujos casos são de alta complexidade

Legenda: : Mais de nove mil bebês vieram ao mundo desde 2019, na maternidade do Hospital Geral César Cals, referência em humanização. Foto: Divulgação

Escrito por Viva Saúde Ceará

O Hospital Geral César Cals, da rede pública estadual, investe em constantes inovações e melhorias nos processos para prestar serviços cada vez mais humanizados às gestantes e aos bebês

É possível e necessário aliar tradição e inovação. É isso que profissionais de saúde do Hospital Geral César Cals (HGCC), maternidade fundada há quase um século, se desafiam a fazer diariamente. A política de humanização norteia todos os serviços da unidade, desde o acolhimento na emergência, que recebeu entre 1,5 mil e 2,1 mil pacientes a cada mês neste ano, até o momento da alta, quando as gestantes voltam para casa e ainda mantêm o vínculo com a equipe.

O perfil da maternidade é atender gestantes de diversos municípios do Ceará cujos casos são de alta complexidade. Mais de nove mil bebês vieram ao mundo desde 2019 no prédio localizado no Centro de Fortaleza, dos quais cerca de 4,2 mil em 2020. Isso não impede a busca constante pela excelência, explicam três profissionais entrevistados que demonstram dedicação à profissão que abraçaram, envolvimento com o local onde a exercem e empatia pelos pacientes que atendem.

O diretor médico do HGCC, Antônio de Pádua, destaca que um dos grandes diferenciais da unidade é ser um hospital-escola no qual os profissionais de saúde adquirem conhecimento e consolidam a formação com uma prática humanizada, mesmo em períodos desafiadores como a pandemia de Covid-19. “Vamos mantendo essa formação contínua. Aqui temos a tradição com constante renovação”, explica o médico que entrou como estagiário ainda na década de 1990, fez residência no HGCC e foi aprovado em concurso há 16 anos.

O cuidado destinado aos próprios profissionais do hospital, inclusive em períodos cruciais como durante a pandemia; e o funcionamento de uma ouvidoria eficiente são outros elementos essenciais desse processo de consolidação da excelência na prestação de serviços, segundo Pádua. “A humanização passa também por quem cuida. Você só vai conseguir humanizar os serviços do SUS (Sistema Único de Saúde), se humanizar o atendimento também para os profissionais”, avalia o diretor.

Referência nacional

São muitas as iniciativas citadas pelo diretor médico para exemplificar o foco nessa política que preza pela humanização. A unidade é referência, por exemplo, para no método “mãe canguru”; no estímulo ao aleitamento materno, com um banco de leite que funciona 24 horas; e, mais recentemente, com o projeto Lean nas emergências.

Em 2018, o HGCC foi a primeira unidade exclusivamente obstétrica a participar do projeto desenvolvido pelo Hospital Sírio-Libanês e do Ministério da Saúde para melhorar o atendimento nos serviços de emergência de hospitais que integram o Sistema Único de Saúde (SUS). A iniciativa prevista para o triênio 2018-2020 faz parte do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (PROADI-SUS).

A enfermeira, com mestrado em ensino na saúde e gerente do Projeto Lean no hospital, Thaís Gomes Falcão, explica as melhorias conquistadas ao longo dos últimos dois anos para reduzir a superlotação. Ela considera que as mudanças refletem diretamente em um cuidado mais humanizado. “A humanização é um conjunto de ações e de valores que culminam num benefício para o usuário, para o paciente, para a sua família, para os profissionais de saúde”, destaca. Reuniões diárias e breves da equipe multidisciplinar colaboram para que cada processo ocorra no tempo certo e haja uma rotatividade maior dos leitos da unidade.

A partir do projeto Lean, a gestora ressalta que o HGCC teve uma melhora considerável de alguns indicadores de atendimento, como, por exemplo, tempo de passagem das pacientes nas salas de parto, que é o tempo que a paciente leva da entrada na emergência até chegar à enfermaria. “Isso implica num atendimento realizado num tempo oportuno, com esse usuário tendo sua demanda de saúde sendo atendida no tempo adequado. Então a paciente que chega para ter seu bebê na maternidade hoje encontra um tempo de passagem 50% menor do que era há dois anos”, ressalta Thaís.

Mãe canguru e amamentação

Muitos bebês que nascem no HGCC chegam prematuramente e precisam ficar alguns dias internados até que ganhem peso e condições ideais para a alta. Nesse contexto, iniciativas como o método canguru e o funcionamento permanente do banco de leite são fundamentais para que a mãe e o bebê tenham o suporte adequado num momento que é também de fortalecer o vínculo entre eles. O banco de leite do HGCC é o único que funciona 24h por dia e todos os dias da semana, auxiliando mães que precisam de orientação para amamentar e recebendo doações para alimentar os bebês prematuros que estão internados.

A enfermeira neonatal do HGCC, Roselise Saraiva, conta como é prestar assistência a esses pacientes com demandas tão importantes para o que pode influenciar a relação dessa criança com a mãe e com toda a família. “A gente já entendeu que a educação em saúde precisa ter uma linguagem que a mãe compreenda. A humanização é um dos pilares do cuidado neonatal no hospital. Não é uma falácia. É algo que a gente trabalha todo dia”, explica Roselise, que é tutora em método canguru pelo Ministério da Saúde.

O método canguru é voltado para recém-nascidos prematuros internados na Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal. O bebê prematuro fica em contato pele a pele com a mãe, de forma gradativa, para ser colocado na posição canguru e assim ficarem períodos diários até que ele atinja o peso mínimo de 2,5kg. Antes da pandemia, o pai também podia participar desse processo, mas houve adaptações para ampliar a segurança de todos os envolvidos, ressalta Roselise Saraiva, que tem mestrado em enfermagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

“A gente trabalha sensibilizando a essa equipe para dar suporte a essa mulher, ofertar o leite na sonda, o contato pele a pele com a mão da mãe tocando o bebê dentro da incubadora até chegar ao tórax dos dois unidos”, conta a enfermeira que confidencia que o vínculo entre profissionais e mães se estende muito além do período de internação. Assim, frequentemente chegam convites para festas infantis e até de 15 anos dos ex-prematuros do HGCC para profissionais que ajudaram aqueles bebês a enfrentarem os dias de internação e a superarem as dificuldades do início da vida.

O médico francês Michel Odent tem uma frase que se tornou célebre para quem atua na saúde, especialmente na assistência ao parto e à amamentação. “Para mudar o mundo, é preciso mudar a forma de nascer”, disse Odent, hoje com 90 anos, professor visitante da Odessa National Medical University e Doutor Honoris Causa da Universidade de Brasília. A história de Odent e dos profissionais que constroem o cotidiano do HGCC mostram que permanecer em busca do aperfeiçoamento é fundamental para pessoas e instituições de qualquer idade. 

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