Bolsonaro perde embate com governadores de direita, e PL sai derrotado em sete de nove capitais no segundo turno

Uma das derrotas mais emblemáticas de Bolsonaro ocorreu em Goiânia

Por Bernardo Mello

Rio de Janeiro - 28/10/2024 

O ex-presidente Jair Bolsonaro vota no primeiro turno em seção eleitoral na Vila Militar, Zona Oeste do Rio — Foto: Alexandre Cassiano/O Globo

Na avaliação de pesquisadores, aliados do ex-presidente que se afastaram da polarização acabaram mais bem-sucedidos

Depois de o PL ter despontado como a sigla mais envolvida em segundos turnos nas capitais, o ex-presidente Jair Bolsonaro registrou ontem derrotas em sete das nove cidades que seu partido disputava, incluindo locais onde se empenhou diretamente nesta reta final, como Belo Horizonte, Goiânia e Palmas. A lista de reveses inclui ainda Curitiba, onde Bolsonaro hipotecou seu apoio a Cristina Graeml (PMB), embora o PL formasse a chapa de Eduardo Pimentel (PSD), que acabou eleito com larga vantagem.

As vitórias do PL em Aracaju e em Cuiabá, além do desempenho expressivo em Fortaleza, sugerem, na avaliação de pesquisadores, que os bolsonaristas que conseguiram se afastar da polarização nacional e ampliar alianças no segundo turno acabaram mais bem-sucedidos do que quem redobrou a aposta numa plataforma mais à direita.

Uma das derrotas mais emblemáticas de Bolsonaro ocorreu em Goiânia, onde Fred Rodrigues (PL) surpreendeu prognósticos e terminou o primeiro turno à frente de Sandro Mabel (União). O ex-presidente mergulhou de cabeça na campanha de Rodrigues e o acompanhou ontem durante a votação, mas não impediu uma derrota de virada para Mabel. Um cenário similar ocorreu em Palmas, cidade visitada por Bolsonaro no sábado, e onde Janad Valcari (PL) acabou superada por Eduardo Siqueira Campos (Podemos).

Pauta de costumes

Nos dois casos, os bolsonaristas pouco ampliaram suas votações na segunda rodada, enquanto seus adversários chegaram a quase dobrar os próprios desempenhos. Para a cientista política Fernanda Cavassana, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), “o discurso bolsona-rista pautado em valores” ajudou a levar aliados do ex-presidente para o segundo turno, mas “não dá conta de administrar a cidade” por si só.

— As campanhas de prefeituras usualmente se pautam por temas do dia a dia das pessoas, e os políticos tradicionais se ancoram no discurso de conhecer esses problemas. Os candidatos bolsonaristas que dialogaram mais com as lideranças locais se mostraram menos “perigosos” — afirmou Cavassana.

Um desses exemplos foi Cuiabá, onde o deputado Abilio Brunini (PL), um dos nomes mais alinha-dos ao bolsonarismo “raiz” no Congresso Nacional, superou no segundo turno o petista Lúdio Ca-bral (PT). No segundo turno, Abilio levou para seu palanque o governador Mauro Mendes (União), que havia apoiado outro candidato na rodada inicial. Apesar do histórico de ataques mútuos entre Abilio e Mendes, o governador justificou seu apoio dizendo que o bolsonarista “amadureceu”.

Além de Cuiabá, a única outra vitória do PL no segundo turno ocorreu em Aracaju, onde Emilia Corrêa (PL) adotou um discurso conservador, mas sem levar Bolsonaro à campanha — já a capital mato-grossense foi visitada pelo ex-presidente na semana passada. Candidatos do PL acabaram derrotados em outras três capitais — Belo Horizonte, João Pessoa e Manaus — que tiveram passa-gens do ex-presidente na reta final. Na capital mineira, lideranças nacionais do PL e do Republica-nos chegaram a tentar atrair o apresentador de TV Mauro Tramonte (Republicanos), terceiro colo-cado, para o palanque do bolsonarista Bruno Engler. A conversa, porém, não evoluiu, e Engler acabou derrotado pelo prefeito Fuad Noman (PSD), que dobrou sua votação mesmo sendo acusa-do falsamente por bolsonaristas, na reta final, de endossar “pedofilia”.

Outro revés ocorreu em Belém, onde Éder Mauro (PL) já havia chegado ao segundo turno em desvantagem para Igor Normando (MDB).

A cientista política Marcia Ribeiro Dias, professora da Unirio, observa que Bolsonaro apostou em quedas de braço com os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União), e do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), e acabou derrotado. Na capital paranaense, Cristina Graeml abraçou o discurso de valores caros ao ex-presidente, enquanto seu adversário focou em aspectos de gestão e se esquivou da disputa nacional.

Onde Bolsonaro comprou a candidatura, perdeu, como em Curitiba e Goiânia. Parece ter havido uma tendência geral de rejeição à polarização, e mais focada nas forças locais — disse a pesquisadora.

Já em Fortaleza, apesar do revés, o bolsonarista André Fernandes (PL) fez uma disputa parelha com o petista Evandro Leitão, decidida por menos de 1%. Fernandes, embora seja conhecido por abraçar o discurso bolsonarista radical, procurou suavizar a imagem e fez campanha no segundo turno ao lado do ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT), seu antigo adversário.

— Há uma emergência de novas forças de direita, com cisões até mesmo na sua facção mais radical, mas que tendem a amparar candidaturas estaduais e nacionais em 2026 — avaliou o cientista político José Álvaro Moisés, da USP.

https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2024/noticia/2024/10/28/bolsonaro-perde-embate-com-governadores-de-direita-e-pl-sai-derrotado-em-duas-de-nove-capitais-no-segundo-turno.ghtml