Pedido de deputada para retirar painel 'Exu te ama' é preconceituoso e intolerante, diz Dragão do Mar
O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura vem lembrar que, conforme a Lei 14.532, de 2023, o racismo religioso é crime", diz a nota.
O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura se pronunciou oficialmente sobre requerimento assinado pela deputada estadual Dra. Silvana (PL) e ressaltou que racismo religioso é crime.
Por Thaís Brito, g1 CE
Painel nas paredes do Dragão do Mar foi alvo de pedido de remoção na Assembleia Legislativa do Ceará — Foto: Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura/Divulgação
O pedido da deputada estadual Dra. Silvana para remover o painel "Exu te ama" da exposição "Festa, Baia, Gira, Cura" foi "fruto de uma compreensão superficial e de argumentos preconceituosos e intolerantes", conforme nota divulgada pelo Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura nesta terça-feira (19). No texto, o complexo cultural ressalta que racismo religioso é crime.
O posicionamento é uma resposta ao requerimento apresentado pela deputada Dra. Silvana (PL) à Assembleia Legislativa do Ceará no dia 11 de outubro. O documento pede a remoção do painel, que compõe a exposição em cartaz no Museu da Cultura Cearense, em Fortaleza.
Na justificativa, a parlamentar aponta que a mensagem inscrita nas paredes do complexo cultural configura uma "agressão" aos valores de uma maioria cristã. O texto também se refere aos credos representados como "notadamente pautados por devoções a entidades esdrúxulas".
Na nota "Dragão do Mar, um museu a céu aberto", o complexo cultural lamenta a tentativa de remoção do painel, que pertence à exposição do antropólogo e fotógrafo Jean dos Anjos, com curadoria de Marília Oliveira e Rafael Escócio.
"Os argumentos utilizados para a crítica são infundados, à medida que se baseiam em uma compreensão superficial sobre a atuação de espaços museológicos e no desconhecimento da memória do centro cultural, além de denotar um preconceito velado e a intolerância com práticas culturais dissidentes. O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura vem lembrar que, conforme a Lei 14.532, de 2023, o racismo religioso é crime", diz a nota.
Em entrevista ao jornal Opinião CE, a deputada Dra. Silvana havia questionado a disposição do painel na parede do equipamento público, afirmando que uma exposição não utiliza os muros da edificação.
O texto do Dragão do Mar rebate esta crítica ao lembrar que ações do complexo cultural já tiveram propostas artísticas fora das salas de exposição, com performances e intervenções audiovisuais nos paredões, na passarela, nas rampas de acesso, na Praça Verde, no hall do Cinema do Dragão e do Teatro Dragão do Mar e na própria fachada.
"Essas intervenções visam despertar a curiosidade das pessoas que passam pelo local, abrindo possibilidades de interação e reflexão, sendo esta também uma forma de reforçar causas ou divulgar exposições a estas ações relacionadas", contextualiza a nota.
Outro exemplo referido no texto é o da exposição "O Sagrado Coração do Ceará", lançada em 2012 no Museu da Cultura Cearense com mais de 200 tesouros da cultura religiosa do Ceará com curadoria dos pesquisadores Gilmar de Carvalho e Dodora Guimarães.
"Mais recentemente, a exposição 'Retrato de Mestre' também apresentou imagens de santos e reproduziu cenários de romarias, sem que surgissem manifestações de repúdio ou questionamento", complementa o texto.
A oportunidade de acesso para todas as pessoas e culturas foi defendida pelo equipamento, que se posicionou como um espaço de democracia e liberdade. A nota do complexo cultural menciona, ainda, que compactua com uma visão de museus que trazem uma mentalidade aberta, liberdade de pensamento e humildade intelectual para abraçar todas as expressões.
Conheça a exposição
Exposição no Centro Dragão do Mar, em Fortaleza, traz referências a religiões de matriz africana com mais de 300 fotografias — Foto: Dragão do Mar/Divulgação
A exposição "Festa, Baia, Gira, Cura" foi lançada no dia 30 de setembro e fica em cartaz até janeiro de 2024. A mostra celebra os 40 anos do terreiro de umbanda e candomblé Cabana do Preto Velho da Mata Escura, situado no bairro Bom Jardim.
O material homenageia a cultura dos povos dos terreiros como parte da história da religiosidade do Ceará. As peças expostas trazem um recorte do trabalho e das pesquisas de Jean dos Anjos, que fotografa, desde 2008, a tradicional Festa de Iemanjá, celebrada no dia 15 de agosto em Fortaleza.
Além de duas salas do museu, a exposição se expande por espaços externos do Dragão do Mar, como paredes, rampas e varanda. Todo o conjunto tem cerca de 300 fotografias e intervenções com vídeo e frases que evocam uma poética e uma estética dos terreiros.
"Arreda homem, que chegou mulher" e "Não chuta, que é macumba" são outras duas frases que se espalham pelo equipamento cultural.
A primeira faz referência à Pombagira, entidade feminina que representa a liberdade, a luta contra o machismo e o patriarcado. A segunda busca subverter uma expressão considerada preconceituosa, conforme detalhou o artista Jean dos Anjos em entrevista ao g1.
Como também explicou, a menção a Exu busca lembrar a entidade na dimensão do amor. "Exu é o orixá que vem primeiro. É o orixá da alegria, da liberdade, da comunicação. É o orixá que abre os caminhos. É o que mais nos alegra quando pensamos no panteão dos mitos afro-brasileiros", detalhou.
Exposição "Festa, Baia, Gira, Cuia"
Local: Museu da Cultura Cearense - Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura
Rua Dragão do Mar, 81 - Praia de Iracema
Horários: de quarta a sexta-feira, das 9h às 18h, e aos sábados, domingos e feriados, das 13h às 18h (com acesso até as 17h30 em todos os dias).
Acesso livre e gratuito
https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2023/10/20/pedido-de-deputada-para-retirar-painel-exu-te-ama-e-preconceituoso-e-intolerante-diz-dragao-do-mar.ghtml
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