Quem é dom Antônio Lustosa, o arcebispo de Fortaleza que pode virar santo
O período mais longo de sua atuação pastoral foi em Fortaleza, onde esteve por mais de 20 anos.
Se tiver a beatificação confirmada, este sacerdote mineiro será o segundo beato surgido de um processo iniciado no Ceará. Em seguida, caso seja canonizado, ele será declarado santo pela Igreja Católica.
Por Leonardo Igor, g1 CE
Após a beatificação da Menina Benigna e a abertura do processo de beatificação do padre Cícero, o Ceará pode ter um novo beato que, embora não seja nascido no estado, teve sua fama de santidade consolidada na terra da luz: o arcebispo dom Antônio de Almeida Lustosa.
No último dia 22 de junho, o mineiro natural de São João del Rei recebeu do Vaticano, sede da Igreja Católica Apostólica Romana, o título de “venerável”, o que significa o reconhecimento de que o sacerdote viveu uma vida de virtudes heroicas seguindo o Evangelho. Esta é mais uma etapa para que dom Lustosa possa passar pela beatificação e, em seguida, pela canonização, quando poderá ser declarado santo pela Igreja Católica.
Ao longo de sua atividade pastoral, dom Lustosa passou por estados como São Paulo e Rio Grande do Sul, foi bispo no Mato Grosso e no Pará e o segundo arcebispo da história de Fortaleza.
Apesar de nascido em Minas Gerais, a maior parte da vida eclesiástica de dom Antônio Lustosa foi fora do seu estado natal. O período mais longo de sua atuação pastoral foi em Fortaleza, onde esteve por mais de 20 anos. Após sua morte, em 1974, foi enterrado na Capital cearense.
“Em todas as dioceses que ele passou e mesmo no seu serviço de padre, ele já se destacava pela espiritualidade, pela caridade e pela sabedoria. Um homem muito inteligente, membro da Academia de Letras em Fortaleza [...]. E de grande devoção no trato com as famílias, com a igreja”, conta o padre Abimael Nascimento, membro da Comissão Arquidiocesana de apoio à canonização de dom Antônio de Almeida Lustosa.
Dom Antônio de Almeida Lustosa passou 22 anos à frente da Arquidiocesde de Fortaleza — Foto: Arquidiciose de Fortaleza
Nascido em Minas Gerais, Dom Antônio Lustosa viveu a maior parte da vida em outros estados — Foto: Arquidiciose de Fortaleza
Dom Lustosa durante celebração eucarística — Foto: Arquidiocese de Fortaleza
Dom Antônio Lustosa foi o segundo arcebispo de Fortaleza e, após sua morte, foi enterrado na capital cearense — Foto: Arquidiocese de Fortaleza
Catedral Metropolitana de Fortaleza chama atenção de quem passa pelo Centro de Fortaleza com a arquitetura de estilo eclético, com predominância de elementos góticos e românicos. — Foto: Alex Costa/Agência Diário
Dom Lustosa em seus últimos anos de vida, em Carpina, Pernambuco, é visitado por sacerdotes da Arquidiocese de Fortaleza — Foto: Arquidiocese de Fortaleza
Dom Antônio Lustosa também fundou uma rádio católica nos anos finais de seu episcopado — Foto: Arquidiocese de Fortaleza
Dom Antônio Lustosa em visita ao Instituto Beneficente São José — Foto: Arquidiciose de Fortaleza
O título de venerável deixa dom Antônio mais próximo do título de beato, atribuído a figuras que são consideradas exemplo de virtudes cristãs e modelo para os católicos. O beato também é um estágio anterior ao título de santo. Se tiver o processo aprovado, dom Antônio Lustosa pode se tornar o segundo beato do Ceará, após a beatificação da Menina Benigna.
Da juventude ao bispado
Nascido em 1886, dom Antônio de Almeida Lustosa ingressou na vida religiosa aos 16 anos, quando se inscreveu no Instituto Salesiano de Cachoeira do Campo, em Minas Gerais. Três anos depois, já era noviço em Lorena, no estado de São Paulo.
Daí em diante, o venerável continuou seu sacerdócio por vários estados do Brasil. Em 1925, aos 39 anos, voltou ao seu estado natal, onde foi nomeado bispo de Uberaba. Mas passou pouco tempo ali: em 1928, foi nomeado bispo de Corumbá.
Na época, ainda não existia o estado do Mato Grosso do Sul. A Diocese de Corumbá, na qual dom Lustosa permaneceu cerca de três anos, correspondia a metade do estado do Mato Grosso – especificamente, a Diocese de Corumbá correspondia ao território integral do que hoje é o Mato Grosso do Sul, uma área de 357 milhões de metros quadrados.
Em 1931, dom Antônio Lustosa foi promovido a arcebispo de Belém do Pará, onde ficou por 10 anos. Em 1941, foi nomeado arcebispo de Fortaleza, cargo que exerceu por 21 anos.
Dom Antônio Lustosa em Fortaleza
Até 1915, Fortaleza era apenas uma diocese. Até então, a capital cearense só tinha tido dois bispos. Entre 1914 e 1915, o então bispo de Fortaleza, dom Manuel Gomes da Silva, conseguiu junto à Santa Sé – a administração da Igreja Católica no Vaticano – a criação da Diocese do Crato e a Diocese de Sobral.
Isso fez com que em 1915, a diocese de Fortaleza fosse elevada a arquidiocese. Dom Manuel, então, virou o primeiro arcebispo de Fortaleza, cargo que exerceu até 1941, quando renunciou e foi sucedido por dom Antônio Lustosa.
“Em Fortaleza, ele desenvolveu um trabalho amplo na dimensão social e eclesial. Escolas populares na periferia de Fortaleza na década de quarenta, cinquenta. Postos de saúde com voluntários católicos na década de quarenta e de cinquenta. Também tivemos as semanas sociais da arquidiocese, as semanas da catequese", enumera o padre Abimael Nascimento, que é professor da Faculdade Católica de Fortaleza.
Conforme dados da Congregação Salesiana, dom Lustosa ergueu na capital cearense mais de 30 paróquias novas, 45 escolas para pessoas carentes e 14 postos de saúde, que funcionavam com atendimento voluntário. É o caso do Instituto Beneficente São José, que funcionou até o 2000 no Centro de Fortaleza como instituição de ensino.
Entre as paróquias que o arcebispo fundou, por exemplo, estão a Igreja de Santa Luzia, no Bairro Meireles, e a Igreja de São João Batista, no Bairro São João do Tauape, onde padre Abimael Nascimento é pároco. Uma das paróquias mais famosas atribuídas ao mandato de dom Lustosa é o Santuário de Nossa Senhora de Fátima, na avenida 13 de Maio, que ele fundou em 1955.
Em 1938, durante o episcopado de dom Manoel, a primeira catedral de Fortaleza, a Igreja de São José, foi vistoriada e sua estrutura foi condenada. A igreja, então, foi demolida, e em 1939 teve início da obra de construção da atual Catedral Metropolitana de Fortaleza, que só seria inaugurada em 1978.
A maior parte dos 39 anos de obra ocorreram sob o mandato de dom Antônio Lustosa à frente da Arquidiocese de Fortaleza, que passou 22 anos no cargo – os próprios vitrais da catedral foram desenhados pelo arcebispo.
Ao deixar a Arquidiocese de Fortaleza em 1963, dom Antônio Lustosa era amplamente popular. Quando morreu aos 88 anos na casa salesiana do município de Carpina, em Pernambuco, seu corpo foi levado para ser sepultado na Catedral de Fortaleza.
"Naquela ocasião, a multidão de pessoas que estava diante da catedral já clamava dom Antônio como santo. Havia uma aclamação popular, que a gente chama de fama de santidade”, destaca padre Abimael.
"Quando o papa João Paulo II veio a Fortaleza na década de oitenta, ele fez a invocação exatamente assim: que repousava nessa catedral ‘um bispo, santo e sábio’. Essa referência de São João Paulo II, então papa João Paulo II, e com toda a proclamação popular de 1974, fez com que em 1996 se abrisse o processo de canonização. Então o que faz abrir esse processo? É a fama de santidade", explica o pároco.
Como funciona a canonização e a comissão de apoio a dom Lustosa
Dentro do regimento da Igreja Católica, a jornada para obter santidade passa por quatro etapas, que culminam na canonização, isto é, na transformação da figura em santo. Alguns processos nunca avançam, outros até galgam etapas, mas nunca chegam a santos, ficando como beatos ou veneráveis.
O processo é conduzido pelo Dicastério para as Causas dos Santos, uma espécie de departamento do governo do Igreja Católica, responsável por analisar os processos de canonização. Ao longo das quatro etapas da canonização, os postulantes podem receber os seguintes títulos:
Servo de Deus, atribuído logo quando o processo é iniciado, isto é, quando já há indícios de virtude suficientes para um processo de canonização ser aberto em nome daquela pessoa
Venerável, que é o atual estágio de dom Lustosa, quando a investigação sobre a vida do religioso é encerrada e suas virtudes são comprovadas
Beato, título dado a um venerável quando há um milagre atribuído a ele, como no caso da Menina Benigna, a única beata do Ceará
Santo, estágio final da canonização que atribui o título apenas àqueles que tiveram um segundo milagre atribuído à sua intercessão, preferencialmente realizado após sua morte
Segundo padre Abimael, a situação atual do processo de dom Lustosa mostra que "a fama de santidade dele e as virtudes heroicas foram reconhecidas pela Igreja Católica". Agora, com o reconhecimento obtido no último mês de junho junto ao Dicastério para as Causas dos Santos, resta esperar por um milagre.
“Agora é época de a gente procurar o milagre, quem tiver um milagre ligado à saúde precisa do laudo médico, o diagnóstico e o prognóstico da pessoa que relatar o suposto milagre. Aí então com esse laudo médico e o texto relato da pessoa, a gente vai coletar como comissão de material e vai remeter a Roma, esperando então que esse relato milagre, sendo reconhecido por Roma, então virá o título de beato para o venerável do Antônio de Almeida Lustosa”, explica.
Há algumas diferenças entre santo e beato. O beato, considerado um modelo de fé e vida cristã, pode ser cultuado em público apenas na região onde há sua fama de santidade. O santo, por sua vez, pode ter culto generalizado, em qualquer parte da cristandade.
Os beatos também não podem ser representados em ilustrações com halos, não podem ser padroeiros de cidades nem ter igrejas dedicadas ao seu nome – apenas aos santos são permitidas estas homenagens.
O processo de canonização pode se estender por décadas. O caso de dom Antônio Lustosa, por exemplo, foi aberto em 1993 em Fortaleza pelo então arcebispo dom Aloísio Lorscheider. No ano 2003, o mesmo pedido de canonização de dom Lustosa foi aberto em Belém do Pará.
Em 2005, os pedidos de Fortaleza e Belém foram unificados e enviados para Roma. O título de venerável de dom Lustosa, isto é, a segunda etapa do processo, só foi concluído em 2023, três décadas depois do início na capital cearense.
Agora, nesta fase de buscas por um caso de milagre atribuído ao arcebispo, a comissão de apoio à beatificação do arcebispo tem boas expectativas de reconhecimento – e já mira na transformação de dom Antônio Lustosa em santo.
"Nós estamos confiantes. Tem muitas pessoas rezando. Já temos alguns relatos de milagres e esses relatos já estão junto ao processo em Roma", conta padre Abimael. “Aí nós vamos rezar mais ainda para ser canonizado, para ser santo”, conclui.
https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2023/07/09/quem-e-dom-antonio-lustosa-o-arcebispo-de-fortaleza-que-pode-virar-santo.ghtml
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