Presidente do Corinthians fraudou ata de reunião da arena que favorecia Odebrecht
Presidente do Corinthians teve 1.848 votos, na ata frudada
[caption id="attachment_131830" align="alignleft" width="300"] Roberto de Andrade, presidente do Corinthians (Foto: Daniel Augusto Jr.)[/caption] Roberto de Andrade assinou ata de assembleia na qual se identificou como presidente dois dias antes de ser eleito. A reunião deliberou sobre um aditivo que daria maior prazo para as obras à empreiteira No fim da tarde de 7 de fevereiro, um domingo, Roberto de Andrade saiu vitorioso na eleição para presidente do Corinthians. De camisa polo azul-clara e com adesivo "Roberto Presidente" colado no peito, o candidato comemorou de braços erguidos e dados com os vices-presidentes da chapa, André Luis Oliveira e Jorge Kalil, e o ex-presidente corintiano Andrés Sanchez. No primeiro discurso, o novo mandatário homenageou os colegas e prometeu trabalho. "Vamos começar daqui a pouco", disse. Na verdade o "trabalho" já tinha começado. Às 10 horas de 5 de fevereiro, a sexta-feira anterior, Roberto de Andrade se apresentou como presidente do Corinthians em reunião que deliberou sobre a Arena Corinthians. Antes de ter sido eleito. O candidato Roberto, identificado como presidente, assinou a lista de presença da assembleia geral de cotistas que tomou uma série de decisões sobre o estádio. Uma delas tratou de um aditivo ao contrato de construção da arena com a Odebrecht. Andrade concordou em dar maior prazo para a conclusão das obras. O aditivo também garantia que a construtora não devia mais nenhum valor à Arena Corinthians. Apesar da autorização em assembleia, o aditivo não foi assinado posteriormente. Outra deliberação ratificou a assinatura de contrato para exploração do estacionamento com a empresa Omnigroup. Em outra foi dada autorização para que a BRL Trust, empresa que comanda o fundo de investimento imobiliário que administra a Arena Corinthians, alterasse, por meio de aditivos, contratos relativos ao financiamento da construção com a Caixa. A reunião deliberou sobre pontos estratégicos para o futuro do estádio. A assinatura de Roberto de Andrade Souza, acompanhada da palavra "presidente" e do escudo do Corinthians, consta na ata da assembleia em questão. A ata da assembleia foi registrada em cartório em São Paulo, no 2º Oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica, e foi obtida por ÉPOCA. O documento foi assinado por representantes dos outros cotistas, Odebrecht e Arena Itaquera. >> Arena Corinthians, a provação alvinegra
A atitude pode ser configurada como falsidade ideológica, quando alguém insere uma declaração falsa em documento público ou privado, segundo advogados consultados pela reportagem. A pena prevista para esse crime pelo Código Penal é de multa e um a três anos de reclusão para documentos particulares, como é o caso da ata em questão. Mas isso depende da avaliação do caso. "O crime só existe se houver relevância jurídica, isto é, se o ato praticado puder causar prejuízo", explica o advogado criminalista Fábio Delmanto. As regras impostas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para fundos de investimentos imobiliários, como o que comanda a Arena Corinthians, também podem ter sido desrespeitadas. A Instrução CVM 472 estabelece que somente podem votar em assembleias gerais os cotistas com representantes legais ou procuradores constituídos legalmente há menos de um ano. ÉPOCA procurou o ex-presidente Mário Gobbi, em exercício naquele momento, para saber se a diretoria alvinegra havia feito uma procuração para que Andrade a representasse na reunião do estádio, mas o ex-presidente preferiu não comentar. A ata não acompanha nenhuma sinalização de que Andrade representava o Corinthians como procurador. Andrade não tinha, naquela data, cargo na diretoria corintiana havia mais de um ano, conforme prevê a ICVM 472. Embora tenha sido diretor de futebol de Mário Gobbi, Andrade deixou o cargo em janeiro de 2014. O atual presidente só voltaria a ter poder legal para representar o Corinthians dois dias após a assembleia em questão, quando venceu as eleições para presidente. O resultado do pleito não era previsível a ponto de encorajar o candidato a se identificar como presidente do clube em uma reunião da arena antes das urnas. Andrade obteve 1.848 votos, 57% do total, enquanto o candidato da oposição, Antonio Roque Citadini, recebeu 1.393, ou 43% dos votos. >> Arena Corinthians dá mais poder a um terceiro Procurado por ÉPOCA, Andrade afirma, por meio de advogado, que a ata da assembleia levou alguns dias para ser lavrada – redigida e registrada em cartório. "Por esse motivo pediram a assinatura dele no documento", diz Luiz Felipe Santoro, advogado do Corinthians. Gobbi, ex-presidente na data da lavratura da ata, não tinha mais condição legal para assinar o documento, ainda de acordo com o advogado corintiano. Santoro acrescenta que Andrade não participou daquela assembleia, embora tenha assinado a lista de presença. O presidente corintiano foi questionado duas vezes sobre a a presença, mas não respondeu às mensagens da reportagem. A justificativa apresentada pelo atual presidente corintiano não o livra de ter cometido uma irregularidade. É comum que a lavratura de atas, em fundos com poucos sócios, aconteça em uma data posterior à reunião. Mas o documento assinado precisa necessariamente refletir o que ocorreu na assembleia. Se Andrade não esteve presente na assembleia, não poderia ter assinado a lista de presença. Em nenhuma hipótese, segundo advogados ouvidos por ÉPOCA, um cotista pode assinar a lista de presença sem ter comparecido à reunião. O fato de Andrade ter sido eleito dois dias após a reunião também não muda a posição que ele tinha no dia da reunião, a de candidato. Em português claro: a ata foi fraudada de qualquer maneira – com ou sem a presença de Andrade na reunião. ÉPOCA também procurou a BRL Trust, responsável por gerir o fundo que comanda a Arena Corinthians. A reportagem deixou mensagens no celular de Rodrigo Cavalcante, sócio diretor da empresa, mas não obteve nenhuma resposta. ÉPOCA ligou para Sérgio Luiz Verardi Dias, advogado da BRL e também presidente da mesa da assembleia geral de cotistas de 5 de fevereiro. Dias pediu para conversar às 14 horas desta sexta-feira (21), mas não atendeu mais o telefone. A reportagem fez quatro tentativas de contato a partir do horário combinado, uma a cada 30 minutos, mas o advogado da BRL não voltou a atender. A Odebrecht, também procurada, afirmou que não vai se posicionar sobre o caso.
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