Bastidores do triunfo azul: redes sociais, call center e carinho a sócios

Por Eduardo Peixoto, Janir Jr. e Vicente SedaRio de Janeiro

Eduardo Bandeira de Mello. Mas pode chamar de Chapa Azul. Mais do que um nome de presidente, o sócio rubro-negro elegeu na segunda-feira a expectativa de um novo formato de gestão no Flamengo. Durante 13 horas de urnas abertas, o movimento iniciado em reuniões de grandes executivos em São Paulo e disseminado por milhares de torcedores em redes sociais atingiu o feudo da Gávea e quebrou algumas certezas de eleições anteriores.

- Os desafios são enormes. E o principal é transformar o Flamengo numa potência do tamanho de sua torcida. Isso envolve futebol, marketing. Queremos fazer o Flamengo do tamanho que essa torcida merece - disse o presidente eleito.

A primeira certeza a cair por terra foi a de que Zico não decide eleição. Depois de uma saída conturbada em 2010, o ex-jogador declarou apoio ao novo grupo, compareceu à votação e agregou credibilidade para que as propostas de governo fossem escutadas pelos sócios. Outra verdade que mudou no pleito de 2012 foi a tese de que o quadro de sócios do Flamengo não é aberto a pessoas e ideias novas. A tese de que os "velhinhos da Gávea" não permitiriam o triunfo de executivos que pouco vivem no clube sucumbiu.

A última certeza sepultada remete à necessidade de carisma e conhecimento interno para vencer. Há menos de um mês, o candidato trabalhado pelos azuis era Wallim Vasconcellos. O Conselho de Administração vetou o nome dele, e a vaga caiu no colo de Eduardo Bandeira de Mello, diretor do BNDES. Rubro-Negro de arquibancada, conselheiro, mas distante do dia a dia político. Mesmo assim, a conversão de votos foi imediata. Como? Mais uma vez, trabalhando pilares conhecidos, porém, eficientes.

Telefone e internet: ferramentas fundamentais na estratégia azul

De acordo com o coordenador operacional da campanha, João Henrique Areias, call center e redes sociais foram os golpes de mestre para garantir a vitória. Na internet, o grupo conseguiu, segundo Areias, mais seguidores do que José Serra em sua campanha para prefeito de São Paulo.

Areias explicou que houve três coordenadores de campanha. Ele ficou com a parte operacional, enquanto o planejamento estratégico teve o presidente da Sky, Luís Eduardo Baptista, o Bap, como responsável. Flávio Godinho, executivo do grupo EBX, de Eike Batista, cuidou da coordenação política da campanha que contou com apoio de diversos ex-presidentes, como Marcio Braga e Kléber Leite, incluindo ex-pares de Patrícia Amorim, como Hélio Ferraz, vice geral da atual gestão, e Luiz Augusto Veloso, que exerceu durante 15 meses o cargo de diretor de futebol e, quando afastado, passou a diretor remunerado do museu que ainda não foi concluído.

- Os pilares da campanha da Chapa Azul foram duas ferramentas que não são novidades. Uma é o call center, para contatar a base de eleitores em condições de votar que o próprio Flamengo oferece aos candidatos, e as redes sociais. Se você olhar as campanhas famosas que foram feitas recentemente, como a do Barack Obama nos Estados Unidos, quem despreza as redes sociais sai atrás, já era. A nossa página no Facebook tem mais de 120 mil pessoas. É mais do que o José Serra conseguiu como candidato a prefeito de São Paulo. O mais importante ali também é que você tem o feedback (retorno). Essas pessoas acabam formando opinião. Não diria pressão, mas é um elemento a mais para fazer com que o sócio sinta a sua responsabilidade - explicou Areias.

Mas se houve capricho na pré-eleição, no dia da votação o planejamento logístico também foi imperativo: a Chapa Azul reservou três estacionamentos próximos à sede da Gávea (dois em clubes e um em um shopping) para facilitar a vida dos eleitores. Mas não só os sócios cariocas mereceram preocupação. Os aliados de Bandeira de Mello também providenciaram transporte do aeroporto e até passagens para associados de outros estados participarem do pleito. Ao longo do dia, atendentes de telemarketing telefonaram para os sócios perguntando se eles já tinham ido ao clube e oferecendo carona.

Se você olhar as campanhas famosas que foram feitas recentemente, como a do Barack Obama nos Estados Unidos, quem despreza as redes sociais, sai atrás, já era. A nossa página no Facebook tem mais de 120 mil pessoas. É mais do que o José Serra conseguiu como candidato a prefeito de São Paulo"

João Henrique Areias, coordenador operacional da campanha da Chapa Azul

Apesar do grupo de empresários bem sucedidos por trás, Areias contou que não houve um grande investidor para a campanha e que chegou a ser feita uma "vaquinha" para que fossem colocados anúncios em jornais cariocas.

- A gente sabia que seria complicada uma eleição na segunda-feira, principalmente para o sócio que não tem obrigação de votar, como acontece no Flamengo, então nós reservamos alguns estacionamentos perto do clube, procuramos facilitar a vida de quem vem de fora do Rio, disponibilizando transporte do aeroporto para cá, por exemplo. Talvez a nossa chapa seja a que investiu menos em termos de dinheiro corrente, tivemos muitos serviços. Tem um empresário ou outro que facilita algumas coisas. Por exemplo, para fazer um anúncio em um jornal de grande circulação no Rio, fizemos uma verdadeira vaquinha, passamos a sacola. A gente tinha valores de doação que eram diluídos, não eram grandes, não existe um grande doador da campanha, existem vários. Então eventualmente algum sócio pode ter tido algum tipo de ajuda em passagem também - disse.

Na estratégia, a Chapa Azul preocupou-se - sem necessidade, após a divulgação do resultado final - com o volume de votos. Imaginava que com muitos eleitores as chances de vitória aumentariam. Mas dos 5.990 sócios aptos a votar, 2.675 compareceram ao clube. Número  semelhante ao das últimas eleições, em 2009. No planejamento minucioso, até a previsão do tempo virou motivo de alerta. Temia-se que um dia de chuva forte e o trânsito complicado carioca desanimassem o comparecimento dos sócios.

- Sem dúvida, foi uma vitória que veio de fora para dentro do Flamengo. Começou nas redes sociais e entrou no dia a dia do clube. Houve uma forte mobilização - disse José Carlos Dias, um dos incentivadores da chapa.

Ao contrário das chapas derrotadas de Patricia Amorim e Jorge Rodrigues, os cabos eleitorais não foram contratados. À exceção de seguranças e chefes de campanha, os demais foram recrutados em redes sociais e Twitter.

- Não ganhei um real. Conheci o pessoal no Facebook e participei das reuniões. Cheguei cedo para trabalhar e estou na disposição até o fim. Já os cabos eleitorais da Patricia ficaram a maior parte do tempo deitados embaixo das árvores - disse Júnior Mendonça.