Ygor Coelho usa ouro no Pan para indicar um futuro melhor

Ygor Coelho é ouro no Pan, e relembra dificuldades, é Brasil. 

Raízes na Chacrinha, mas com o mundo lá fora: Ygor Coelho usa ouro no Pan para indicar um futuro melhor Campeão festeja vitória, mas relembra dificuldades: "(Passa na cabeça) o projeto do meu pai, as pessoas que perdi para o tráfico, amigos meus, pessoas que estão lutando pelos seus sonhos" Por Edgar Alencar e João Gabriel Rodrigues — Lima, Peru Ygor Coelho é ouro no Pan, e relembra dificuldades, é Brasil. O calor angustiante das ruas da Chacrinha parece uma miragem diante do frio que faz durante boa parte do ano em Aarhus. A distância e as diferenças entre a comunidade da Zona Oeste carioca e a segunda maior cidade da Dinamarca, porém, soam como uma extensão do mundo de Ygor Coelho. O sorriso aberto, a gargalhada peculiar, o jeito brincalhão que se mistura com a timidez. Nenhum dos traços marcantes do carioca se perdeu em meio à baixa temperatura do inverno europeu. Ao deixar seu berço para buscar novos caminhos para crescer, Ygor precisou desafiar novamente os prognósticos que enfrentou lá atrás. Hoje, ao conquistar o ouro inédito do badminton nos Jogos Pan-Americanos, em Lima, se reafirma como exemplo para os jovens de seu antigo habitat e que sonham, também, com um caminho menos árido. - (Passa na cabeça) exatamente tudo isso, o projeto do meu pai, as pessoas que perdi para o tráfico, amigos meus, pessoas que estão lutando pelos seus sonhos. E morar fora do país, passar frio, sem comer às vezes direito, sem dormir direito pensando se vai dar certo. Mas pensei no meu pai, pensei nas pessoas que estão lá (na Chacrinha) e não têm oportunidades. Agarrei muito bem as minhas oportunidades, lutei, fui para fora do país, passei muitas dificuldades, me lesionei esse ano, e poder conquistar essa medalha de ouro é sensacional. Eu tenho orgulho. Ser o número 1 significa que, se eu consegui sair da Chacrinha através de um projeto social e chegar à seleção brasileira, morar fora do país, aprender inglês, cultura... se eu consegui, por que não os outros que estão lá? Basta sonhar e lutar muito que um dia Deus recompensa – afirmou o jovem, de 22 anos. Ygor surgiu para o mundo através do projeto de seu pai. Sebastião, então apaixonado por natação, queria construir uma piscina na comunidade para dar aulas a jovens de lá. No meio do caminho, descobriu o badminton. Os fundos da piscina logo se transformaram em local de treino de um esporte que poucos conheciam no país. Sem verba, incentivo ou apoio, Sebastião lutou para transformar a Miratus em uma referência. Mal sabia que seu próprio filho sairia de lá para se tornar o grande nome da modalidade nas Américas. Mesmo tão jovem, Ygor acumula feitos. Foi o primeiro brasileiro a se classificar para as Olimpíadas no badminton. Também foi o primeiro a conquistar um - e depois dois - Pan-Americano da modalidade. Em Lima, se transformou no primeiro atleta do país a disputar uma final individual para, no dia seguinte, se tornar o primeiro a ganhá-la. Depois de ter projeção internacional e chegar a ocupar um lugar entre os 40 melhores do mundo, Ygor precisou buscar um novo caminho. Após os Jogos Olímpicos do Rio, deixou o país. Ficou um tempo em um clube na França como boleiro, à procura de um técnico e um espaço para treinar na Europa. Com a ajuda do Comitê Olímpico do Brasil, conheceu a dinamarquesa Nadia Lyduch. A técnica viu potencial no menino e o levou para a fria Aarhus. O orgulho ao vê-lo conquistar um título inédito prova que o caminho foi bem feito. - Ygor se tornou um amigo, um membro da família, é um ótimo garoto e eu estou sempre perto dele. Quando ele está frustrado eu faço o papel de mãe, então tudo o que eu faço é um trabalho integrado. Ele tem um preparo mental para não sentir tanto a pressão dos jogos. Criamos nele um espírito guerreiro e hoje vemos uma grande diferença nele, tanto tática como tecnicamente – disse a treinadora sobre o pupilo, a quem chama, com carinho, de “Ygordinho”. - Ygor, na Dinamarca, é um nome russo, e ele não tem nada de russo. Como brasileiro sempre acaba as palavras com “inho”, comecei a chamá-lo assim. Mas não sabia que brincava com gordinho (risos). Mas claro que não é gordo. Acho até que poderia ter escrito na camisa dele “Ygordinho”, mas acho que a Federação Internacional não iria deixar – disse a dinamarquesa. Mas ao mesmo tempo que a treinadora deixa marcas em seu estilo, Ygor não esquece de onde surgiu. A brincadeira com o pai o alçou ao posto de esperança de dias melhores para outros moradores da Chacrinha. Se Sebastião, lá atrás, não ficou muito feliz com a decisão do filho de mudar de país, o filho mostra que deixou suas raízes fincadas na antiga comunidade. - Pai, muito obrigado por me ensinar grandes lições, me fazer acreditar que nada é impossível: “O que eu quero, eu posso, eu vou conseguir, conseguir o que? Me superar”. Meu pai que me deu essa oração, e todo dia ele faz. Se não fosse por ele eu não teria essa garra. Acho que puxei do sangue do meu pai. O Pan de Lima O Pan de Lima reúne cerca de 6.580 atletas de 41 países das Américas. Dos 39 esportes, 22 valem como classificação para os Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020. No total, o Brasil terá 485 atletas em ação na capital do Peru. E os canais SporTV transmitem ao vivo os principais eventos até o dia 11 de agosto.

Ygor Coelho festeja com sua técnica, Nadia Lyduch — Foto: Alexandre Loureiro/COB

Ygor Coelho festeja na final do badminton — Foto: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte

Ygor Coelho é ouro no Pan (Alexandre Loureiro/COB)

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