Morre Elzenir Colares, considerada a Dama do Folclore Cearense

Ela foi uma espécie de gênio da família, era muito culta, tem várias formações, falava quatro idiomas, recorda Irajá.

Legenda: Elzenir Colares em registro de agosto de 2006 - Foto: Fernanda Oliveira

Escrito por Redação

A folclorista fez sua passagem na manhã deste sábado (20/06), aos 85 anos

Findou, na manhã deste sábado (20/06), o espetáculo terreno da “Dama do Folclore Cearense”. A professora, pesquisadora, artista e folclorista Elzenir Colares despediu-se, aos 85 anos, de uma trajetória inteiramente dedicada ao convívio íntimo com as letras e a dança. De acordo com o irmão mais novo de Elzenir, Irajá Alberto, ela estava com Alzheimer há cinco anos, o que levou ao falecimento.

“É uma lacuna muito grande. Ela foi uma espécie de gênio da família. Ela era muito culta, tem várias formações, falava quatro idiomas. Foi muito estudiosa, sempre ficava em primeiro lugar", recorda Irajá.

Elzenir era formada pelo curso superior de Letras Anglo-Saxônicas. No final da década de 1950, a cearense mudou-se para Madri para estudar língua e literatura espanholas. Lá, também cursou Danças Espanholas e, de volta a Fortaleza, passou a integrar o quadro docente da Casa de Cultura Hispânica. Nesse período, ajudou a criar o Grupo Folclórico Hispano Brasileiro - GFHB (1966), que, nove anos mais tarde, viria a tornar-se o Grupo de Tradições Cearenses (GTC).

“Foi uma mulher determinada. Conseguiu sensibilizar muitos jovens e manteve, com destaque na mídia e na comunidade, seu Grupo de Tradições Cearenses”, lembra o pesquisador Gilmar de Carvalho, sobre o coletivo que ela coordenou por 45 anos, e que, em 2020, completa 54 anos em atividade.

Com o GTC, Elzenir produziu espetáculos que exploram a música, dança, costumes e causos da cultura popular colhidos em todo o Ceará. Algumas montagens de sucesso foram: “No Ceará é Assim”, “Eita Ceará Pai D’égua” e “Festa de Padroeiro”.

O atual presidente do grupo, Artur Rocha, reconhece a influência que ela segue exercendo nas atividades até hoje.

 "As danças ainda são as montadas por ela, as músicas ainda são as que ela escolheu. Tudo o que eu sei de folclore, esse amor pelo folclore, eu aprendi com ela. Como várias outras pessoas que saíram do grupo e estão em outros grupos. Frutificou o trabalho dela e era isso que ela queria”, reflete.

Sob o olhar de Gilmar de Carvalho, essa semente tem uma marca. "Podia-se até discordar do que ela fazia, mas foi notável seu empenho em relação às manifestações parafolclóricas. Não conseguimos avançar em termos de balés, como Pernambuco ou Bahia, que passaram a usar o folclore como ponto de partida para uma criação mais ousada. Mas ela valeu muito pelo que fez. Era inconfundível sua concepção, a partir de uma idealização do passado, e notável o acabamento e a visão apoteótica de conjunto que ela obtinha com muito esforço e abnegação. Será lembrada como a mulher que lutava para colocar em cena aquilo que sabia fazer, o que acreditava e era aplaudido por uma Fortaleza que interagia mais com seus produtores culturais", acredita.

Em comunicado oficial, o Grupo de Tradições Cearenses informou "a passagem para o plano Superior de sua fundadora, inspiradora e eterna presidenta de honra, professora Elzenir Colares". Em outro trecho, afirma: "Nascida na Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, este não poderia ter sido outro berço dela, semelhante ao berço esculpido em madeira, pelo professor Jaime Alberto da Silva, pai dela. Viveu intensamente, carnavais, quermesses, festas tradicionais e populares. Viajou todos os rincões do Ceará, do Brasil e do Mundo. Federico Garcia Lorca era a sua inspiração".

A nota também ressalta outra importante característica de Elzenir: "Formou gerações de professores, pesquisadores, amantes do folclore e ensinou os que a seguiam a valorizar cada momento e cada manifestação da nossa cultura, sempre levando ao palco, lhe dando o brilho da arte, mas mantendo sempre a sua essência, sem tirar a originalidade. Elzenir Colares é eterna, em seus ensinamentos do folclore e língua, literatura e cultura espanholas e em seu legado. Amor pelo folclore que permanece vivo com o Grupo de Tradições Cearenses. A ela, o mais sincero agradecimento e reconhecimento do GTC. Que fiquem sempre os nossos aplausos".

As secretarias de Cultura municipal e estadual também manifestaram seu pesar. “Elzenir inspirou, e formou inúmeras gerações de brincantes, pesquisadores, professores, e amantes do folclore cearense e brasileiro. Sempre fiel às tradições, Elzenir buscava a cada aula ensinar um pouco da beleza de se retratar fidedignamente as danças e tradições populares, garantindo o brilho e leveza da arte”, destaca a nota da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará.

A Secultfor lamentou o falecimento, ressaltando a importância da artista para as novas gerações. "Nos associamos aos seus familiares e a todos que fazem o Grupo de Tradições Cearenses e a todos que resistem construindo a Cultura popular da cidade. Elzenir ficara nas nossas lembranças e na inspiração de abrir caminhos, desbravar oportunidades para erguer nossa identidade cearense, com respeito aos artistas de todas as culturas que ajudou a representar e valorizar", diz o registro.

O Grupo Miraira do IFCE agradeceu pela dedicação de Elzenir à tradição popular cearense. "Obrigada por sua valentia, coragem e determinação em abrir fronteiras, sonhar alto e envolver a juventude pulsante em seus sonhos como mulher/artista/dançarina apaixonada pela tradição popular!".

Ao longo da carreira, a folclorista recebeu inúmeras homenagens, a exemplo da Medalha Boticário Ferreira (1995) e, mais recentemente, da Comenda Patativa do Assaré (2019), reconhecimento instituído por Lei Estadual, que é concedido a artistas, poetas, cantadores e personalidades que se destacaram pelas relevantes contribuições à Cultura Popular Tradicional. 

https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/verso/morre-elzenir-colares-considerada-a-dama-do-folclore-cearense-1.2957658