Auxiliares de Lula no Planalto e na equipe econômica consideram que casar medidas de corte com projeto sobre IR contribuiu para alta do dólar. Lula quer melhorar relação com o mercado.
Por Guilherme Balza, Guilherme Mazui, GloboNews e g1 — Brasília 23/12/2024
'Pacote saiu pela culatra': comentaristas analisam disparada do dólar após pacote de corte de gastos
Quase um mês após a divulgação do pacote de controle de gastos e do projeto de mudanças no Imposto de Renda (IR), auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no Palácio do Planalto e na equipe econômica, concordam que o governo cometeu erros na apresentação das medidas e que é preciso um freio de arrumação nesse tema.
Em café com jornalistas na sexta-feira (20), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, admitiu que erros na comunicação do pacote contribuíram para a alta do dólar e a reação negativa do mercado.
No dia 27 de novembro, Haddad anunciou o pacote de cortes, em pronunciamento na TV e no rádio, junto com a proposta de isentar a partir de 2026 do pagamento de IR quem ganha até R$ 5 mil mensais. O pacote foi aprovado pelo Congresso, mas o projeto do IR não foi enviado até o momento.
Numa tentativa de corrigir os equívocos, Lula colocou em prática uma mudança no discurso em relação ao Banco Central. O petista também garantiu a aliados que não quer brigar com o merca-do.
Nos próximos quatro anos, sendo os dois finais do terceiro mandato de Lula, o BC será comanda-do por Gabriel Galípolo, que tem uma relação muito próxima com o presidente e com Haddad.
Na sexta-feira, Lula gravou um vídeo, ao lado de Haddad e Galípolo e da ministra do Planejamento, Simone Tebet, para defender a autonomia do novo presidente do BC e prometer responsabilidade com as contas públicas.
O publicitário Sidônio Palmeira, cotado para ser ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), foi o responsável pela produção do vídeo.
Tanto Galípolo quanto Sidônio afirmaram a aliados que a iniciativa de gravar a mensagem partiu do presidente. Lula, no entanto, disse em discurso a ministros, também na sexta-feira, que Galí-polo o convenceu de que era preciso pacificar a relação com o mercado.
Aliados do presidente já defendiam que ele transmitisse uma mensagem para tentar reverter a crise com o mercado e, consequentemente, amenizar a alta do dólar.
Em 6 de novembro, a moeda norte-americana era cotada a R$ 5,67. Com a demora no anúncio do pacote, a cotação fechou em R$ 5,91 no dia 27, data do anúncio das medidas. Na última semana, o dólar bateu em R$ 6,30 e encerrou a sexta em R$ 6,07 após uma série de leilões do BC.
Erros na comunicação
Enquanto o pacote fiscal estava em discussão, houve uma divisão no governo: integrantes da equipe econômica, incluindo Haddad e Tebet, defendiam a tese de que a divulgação do pacote deveria tratar unicamente de medidas de contenção de gastos, sem misturar o tema com a reforma da renda.
Outro grupo, que incluía auxiliares de Lula no Palácio do Planalto e ministros da área social, desejava o anúncio casado para evitar a ideia de que um governo do PT estaria operando um corte de gastos apenas com medidas que afetavam a população de baixa renda. Essa tese prevaleceu.
Sidônio, que foi o marqueteiro da campanha de Lula, teve peso importante na discussão. Ele foi um dos principais defensores do anúncio conjunto. O publicitário, inclusive, participou da produção do pronunciamento de Haddad e esteve naquela mesma noite num encontro do ministro com par-lamentares do PT.
O dia seguinte ao pronunciamento foi marcado por reações opostas. O mercado respondeu negativamente, assim como o centrão no Congresso. A militância petista celebrou as medidas. Nas redes sociais, as manifestações positivas superaram as negativas, segundo integrantes do Planal-to que monitoram as reações nas plataformas.
A repercussão positiva nas redes, no entanto, durou 24 horas. No dia seguinte, a alta do dólar e as críticas ao pacote contaminaram a opinião pública e derreteram a reação positiva às medidas anunciadas.
O governo planejava uma campanha ostensiva nos dias subsequentes ao anúncio do pacote, como parte da estratégia política de convencer a sociedade da importância das medidas e, assim, vencer a queda de braço com o mercado. O governo faria uma disputa política em torno do tema.
A Secom havia preparado uma série de materiais de redes sociais para destacar o impacto da isenção do IR na vida das pessoas. A Fazenda barrou as peças por entender que a divulgação agravaria a reação negativa.
O Planalto também lançaria uma campanha publicitária para os dias subsequentes ao pronunciamento sobre o pacote. Órgãos de controle do governo alertaram que seria um contrassenso gastar dinheiro com publicidade para divulgar medidas de contenção. A campanha foi engavetada.
Auxiliares de Lula avaliam que o saldo foi ruim, com o governo duplamente derrotado: em função da reação negativa do mercado, muito acima da esperada pelo governo; e por deixar de colher os louros da isenção do IR.
https://g1.globo.com/politica/noticia/2024/12/23/integrantes-do-governo-admitem-erros-na-apresentacao-do-pacote-de-gastos-e-defendem-freio-de-arrumacao.ghtml