DEFESA DO CONSUMIDOR
O mercado consumidor brasileiro passou por grandes transformações nos últimos anos. Com a política de valorização do salário mínimo, os programas de transferência de renda e o aumento do ganho real dos trabalhadores, muitos cidadãos ascenderam de classe social, engrossando, assim, o rol daqueles que passaram a adquirir mais produtos e serviços. Entretanto, embora com a demanda aquecida, as empresas fornecedoras deram e continuam a dar a impressão de que não têm se preocupado em acolher devidamente esse novo público, resultando em um volume cada vez maior de reclamações, sobretudo na telefonia, energia elétrica, saúde e transporte aéreo.
Privatizados ainda nos anos 1990, a desestatização desses setores, por exemplo, veio acompanhada da criação de agências reguladoras. O Estado deixa de ser produtor de obras e serviços de infraestrutura, possibilitando a entrada da iniciativa privada em áreas estratégicas até então controlados exclusivamente pelo poder público. Estes órgãos foram criados para executar então as atividades de regulação e defesa dos interesses públicos, voltadas a estabelecer os critérios de eficiência e a fiscalização da prestação dos serviços em seus aspectos sociais, econômicos, técnicos e jurídicos.
Mas será que essas agências vêm cumprindo o seu papel? No momento em que o consumidor mais precisa, a atuação dos órgãos reguladores tem surtido efeitos positivos no mercado? Para os especialistas consultados a resposta é negativa.
Relação precisa avançar
Desde o seu estabelecimento até os dias atuais, a qualidade de alguns serviços públicos não têm melhorado e a relação das agências reguladoras não só com o consumidor, mas com os demais agentes do mercado - empresas reguladas e órgãos de defesa do consumidor - ainda tem muito o que avançar.
A crises no setor de telefonia móvel e o caos nos aeroportos e no transporte aéreo no País nos últimos anos deixa claro que apenas a criação de uma agência reguladora não resolve a questão. Questões como a administração das agências, a burocracia e a submissão, em alguns casos, a interesses políticos também são apontados por especialistas e entidades de defesa do consumidor como problemas.
Segundo a coordenadora institucional da Proteste Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci, as críticas começam pelo fato de as empresas reguladas não respeitarem o Código de Defesa do Consumidor (CDC), com a conivência das agências. "O que eu vejo é que as agências em geral não vêm cumprindo seus objetivo. E quanto mais a gente avalia, a gente vê que tem muito a avançar. A telefonia é um exemplo. Desde a privatização do setor, aumentou-se os acessos, mas existem problemas graves com a qualidade dos serviços prestados. A Pro teste tem feito muitas mobilizações para apontar as falhas e cobrar soluções, e, no entanto, as reclamações não diminuem", diz.
Outro exemplo, acrescenta Maria Inês, vem do setor de energia. "Existem mais de R$ 8 bilhões que foram cobrados indevidamente dos consumidores nas contas de luz entre 2002 e 2009, e que não se consegue que sejam devolvidos. Ao mesmo tempo, houve redução nas tarifas no ano passado e agora já se fala em mais um aumento", lembra a especialista.
Faltam regras mais rígidas
Conforme disse, "além de garantir a qualidade dos serviços, falta regras mais rígidas e que de fato elas sejam cumpridas". "Não há fiscalização adequada sobre a prestação dos mesmos", critica. Para o professor de Direito do Consumidor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Hércules do Amaral, as agências reguladoras não são e nem devem ser vistas como órgãos de defesa do consumidor. "Não é assim em nenhum lugar do mundo. Porém, elas não podem nem por omissão e nem por ação serem voltadas aos interesses dos fornecedores dos serviços. Elas devem estar aí para defender o mercado como um todo, mas buscando o equilíbrio na relação com o consumidor e as empresas", afirma.
Anchieta Dantas Jr.
Repórter
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