Alves adia instalação de comissão sobre PEC das reservas indígenas

Índios de várias etnias viajaram a Brasília para protestar contra o projeto.

Pressionado por dezenas de índios que vieram a Brasília protestar contra a Proposta de Emenda à Constituição que modifica as regras de demarcação de reservas indígenas, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), anunciou nesta terça (1º), por meio de nota oficial, o adiamento da instalação da comissão especial encarregada de analisar o projeto.

O texto sobre a demarcação das terras é de autoria do ex-deputado Almir Sá (PPB-RR), é apoiado pela bancada ruralista. Já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas, antes de ir ao plenário, tem de ser avaliado pela comissão especial. A proposta é alvo de críticas dos índios por retirar do governo federal a autonomia para demarcar terras indígenas, de quilombolas e zonas de conservação ambiental.

Na nota divulgada por sua assessoria de imprensa, Henrique Alves ressalta que pretende ampliar o diálogo entre os setores envolvidos “para evitar tensões e viabilizar um acordo”. O debate, segundo a nota, será mediado pelos poderes Legislativo e Judiciário.

Há 20 dias, mesmo sob protesto de líderes indígenas, o presidente da Câmara havia afirmado que iria instaurar o colegiado. A instalação da comissão parlamentar motivou a ocupação da Câmara por dezenas de indígenas de várias etnias em abril.

Na ocasião, para pressionar a direção do Legislativo a não criar o comitê, os índios tomaram o plenário principal e interromperam por mais de duas horas as atividades da Casa. Os indígenas só aceitaram deixar o prédio da Câmara depois que Alves prometeu não instalar a comissão no primeiro semestre.

Nesta terça, com a segurança do Congresso reforçada, um grupo de índios de diversas tribos se limitou a fazer uma manifestação pacífica na Esplanada dos Ministérios contra a PEC 215, que propõe mudanças nos critérios de demarcação.

Audiência pública
Por intermediação da senadora Ana Rita (PT-ES), uma comitiva de 70 índios foi autorizada pela polícia legislativa do Senado a acompanhar uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Casa. O restante dos indígenas se manteve sob uma lona de circo instalada nos gramados da Esplanada, em frente ao prédio do Congresso Nacional.

De acordo com a presidente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Sônia Boni, os índios não ficarão mais parados assistindo ao movimento da bancada ruralista no Congresso para impedir a participação dos índios na questão de demarcação de terras. Ela também se disse inconformada com o tratamento dado na chegada ao Senado.

"Mais uma vez, ao chegar na Casa, somos recebidos com a truculência da polícia. A gente não entende porque, sendo a casa do povo, a gente não pode entrar e discutir as questões que estão sendo tratadas.[...] Se as coisas estivessem acontecendo como na Constituição Federal, a gente não precisaria estar aqui", afirmou.

Um dos principais pontos debatidos durante a audiência foi a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que retira do governo federal a autonomia para demarcar terras indígenas, de quilombolas e zonas de conservação ambiental. Pelo texto, caberá ao Congresso Nacional aprovar proposta de demarcação enviada pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Atualmente, o Ministério da Justiça edita decretos de demarcação a partir de estudos feitos pela Funai.

"Isso é muito ruim. Eu, particularmente, entendo que isto é inconstitucional, porque a execução de políticas cabe ao Executivo fazer, não cabe ao Legislativo. Cabe ao Legislativo sim fazer as leis e fiscalizar a implementação das leis, mas não executá-las", disse a senadora Ana Rita.

Audiência adiada
Além de adiar a instalação da comissão especial, Alves também solicitou o cancelamento da audiência pública agendada para esta quarta (2) que iria discutir sobre a delimitação de terras indígenas no sul da Bahia, em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. O evento organizado pela Comissão de Agricultura esperava contar com a presença do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

Nesta terça, ocorre o dia da Mobilização Nacional Indígena. Para marcar a data, lideranças indígenas pretendem promover um ato público, às 16h, em frente ao Congresso Nacional. A manifestação irá criticar propostas que restringem os direitos de populações indígenas, entre as quais a PEC 215/2000.

Índios acompanham nesta terça debate na Comissão de Direitos Humanos no Senado (Foto: Luciana Amaral/G1) 

Fabiano CostaDo G1, em Brasília