Violão de Cego Aderaldo é furtado em Quixadá

Quixadá. Herdeiros de um personagem histórico da cultura popular, Aderaldo Ferreira de Araújo, mais conhecido como Cego Aderaldo, estão a procura de uma das mais importantes peças do seu acervo, um violão com mais de 100 anos, segundo a nora do poeta e repentista, Maria Nair Brito. O instrumento musical desapareceu da casa de Cego Aderaldo, em Quixadá.

Ela registrou Boletim de Ocorrência (B.O) na última segunda-feira (22) relatando o fato. O violão foi fabricado pela Violões Vianenses, uma indústria de Gramado, no Rio Grande do Sul. "Por ser uma peça tão velha tem apenas valor histórico e sentimental", frisou a herdeira.

Maria Nair só notou o desaparecimento no último fim de semana. Apesar de ter registrado B.O por furto, ela acredita que o autor do delito seja algum músico. Nenhuma outra peça, algumas até de valor comercial, foi levada. O imóvel está fechado desde o ano passado. Apenas de dois em dois meses alguém da família segue de Fortaleza até o Sertão Central, para dar manutenção nas relíquias de um dos mais famosos repentistas brasileiros e realizar a limpeza no imóvel, tirar a poeira.

As roupas, a bengala, o relógio de parede, guarda-roupas, até a espreguiçadeira predileta do repentista estão guardados no imóvel mantido pela família. Nada foi catalogado ainda. Apenas a reportagem do Diário do Nordeste registrou fotograficamente parte do acervo, numa entrevista realizada com a então presidenta da Fundação Cultural de Quixadá, Irisdalva de Almeida, mais conhecida como Dadá, em 2007. Na época, havia promessa da criação do Memorial, em homenagem ao poeta e repentista, mas o projeto ainda não foi concretizado.

Implantação

Em setembro de 2012 Dadá havia recebido a informação da Secretaria de Cultura do Ceará (Secult) da liberação de R$ 500 mil para implantação do Memorial de Cego Aderaldo, cujos trabalhos haviam sido encabeçados por ela. No início, a ideia era transformar a casa de Cego Aderaldo, na Avenida Plácido Castelo, no recanto pessoal para apreciação de seus admiradores e de turistas que visitam a Cidade.

Todavia, conforme Dadá, à época, uma herdeira, uma nora do violeiro, ainda utilizava o imóvel como moradia e havia solicitado para o Memorial ser implantado noutro local. O velho casarão de Maria Gomes, no Centro, erguido defronte à Praça José de Barros, foi escolhido.

O prédio pertence ao Estado, mas precisa de restauração. Tanto o Município como a Secult haviam considerando a mudança do local como melhor opção. O casarão foi adquirido logo após o início da luta pela implantação do espaço cultural dedicado a Cego Aderaldo. Além dessa vantagem, preserva as características da época em que viveu o poeta repentista.

O atual presidente da Fundação Cultural de Quixadá, Blasco Monte, informou ter agendado visita ao secretário de Cultura do Estado, Francisco Pinheiro, para discutir a implantação do Memorial, dedicado a Cego Aderaldo. Ele confirmou o valor da obra entre R$ 500 mil e R$ 600 mil.

A ideia é transformar realmente o casarão de Maria Gomes. Ele pretende inclusive ampliar o projeto e incluir nas edificações a construção de um espaço para transferir a Escola de Música do Centro Cultural Rachel de Queiroz para o Memorial.

Obras

Sobre o desaparecimento do violão, Blasco Monte lamentou o ato. Ele acredita ser sido praticado por algum desocupado, sem consciência da importância histórica para a cultura de Quixadá e nacional. Para evitar mais perdas ele pretende agilizar o inicio das obras do Memorial.

Monte afirmou ainda que também está procurando catalogar os bens com valor histórico deixados por Cego Aderaldo. Há ainda a possibilidade de uma permuta do imóvel onde o poeta repentista morou a maior parte da sua vida com os herdeiros. Mas, por enquanto, Maria Nair está disposta apenas a abrir as portas da casa para visitações.

Conforme Nair, uma das visitas foi a do cineasta Rosemberg Cariry e sua equipe. Ele estava trabalhado num projeto, um documentário dedicado ao sogro, Cego Aderaldo.

Ela disse ainda ter sido o cineasta e também poeta quem a auxiliou economicamente na restauração da casa, com quase um século de história. "Qualquer outra ajuda será bem-vinda", mas, atualmente, a recuperação do violão furtado é a principal preocupação dela, e com certeza dos admiradores da cultura popular brasileira.

Valorização

Considerado um dos maiores preservacionistas da cultura popular nordestina, Rosemberg Cariry demonstra preocupação quanto ao acervo de Cego Aderaldo. Na avaliação do cineasta, o Município e o Estado já deveriam ter implantado o Memorial. Cariry ainda destaca a necessidade de valorização do artista popular e também da sua história. O documentário "Cego Aderaldo - O Cantador e o Mito", produzido por ele destaca o personagem como um grande expoente da cantoria poética nordestina no início do século XX. Foi um dos destaques do 22º Cine Ceará - Festival Ibero-americano de Cinema, em junho do ano passado.

Mais informações

Fundação Cultural de Quixadá
Praça da Cultura S/Nº - Centro
(88) 9939.2506
http://www.quixada.ce.gov.br/
blascomonte@hotmail.com

FIQUE POR DENTRO

O poeta e os versos populares

Aderaldo Ferreira de Araújo, posteriormente consagrado como Cego Aderaldo, nasceu na cidade do Crato, aos 24 de junho de 1878. Mas foi na cidade de Quixadá que ele viveu a maior parte de sua vida.

Quando adulto, se destacou pelo seu aguçado raciocínio na arte de improvisar rimas em cantoria de desafio e sua história de vida. Após a morte do pai, perdeu a visão. Cego e pobre, não tendo a quem recorrer, ele teve um sonho em versos. Foi quando descobriu o dom de cantador e de improvisar rimas.

Para sobrevier ele também apresentava sessões de cinema itinerantes por todos os cantos do Brasil.

Ele mesmo rodada a manivela do projetor e narrava as estórias. Naquela época os filmes ainda eram mudos. Cego Aderaldo morreu aos 29 de junho de 1967, na cidade de Fortaleza, quando tinha 89 anos. O artista nunca casou, mas criou 26 filhos adotivos.

Alguns objetos utilizados por Cego Aderaldo foram preservados e permanecem guardados em uma casa, no Município de Quixadá. A família espera a criação de um Memorial.

ALEX PIMENTEL
COLABORADOR