Crédito do Trabalhador: os prós e contras do novo consignado para CLT

O que é crédito consignado

Escrito por Ana Alves - 30 de Setembro de 2025 

Legenda: O crédito consignado é um empréstimo em que as parcelas são descontadas automaticamente da folha de pagamento do tomador.

Foto: Shutterstock

A recente divulgação de pesquisa feita pelo Banco Central, no último dia 29, revela um fenômeno preocupante: os juros praticados para o novo crédito consignado no setor privado estão, em muitos casos, mais altos do que aqueles que vigoravam nos contratos antigos firmados via convênios entre empresas e bancos.

Essa constatação acende alerta para trabalhadores que pensam em contratar empréstimo consignado — instrumento que costuma ser visto como “menos arriscado” para o devedor — e exige atenção redobrada.

Vamos entender o tema, suas implicações e, ao final, oferecer orientações práticas para quem considera contratar esse tipo de crédito.

O que é crédito consignado

O crédito consignado é um empréstimo em que as parcelas são descontadas automaticamente da folha de pagamento do tomador — seja servidor público, aposentado, pensionista ou empregado com carteira assinada (CLT).

Por causa dessa garantia de pagamento “automático”, os juros costumam ser menores do que em modalidades como o crédito pessoal comum.

Até agora, no setor privado, essa modalidade exigia convênios entre empresas e instituições financeiras. Ou seja: apenas trabalhadores de empresas que já tinham acordo de consignado poderiam contratar nessa linha.

Com o novo modelo regulado pela Lei 15.179/2025, foi criada a plataforma digital “Crédito do Trabalhador”, pela qual empregados formais podem simular e contratar consignado diretamente, sem depender do convênio da empresa.

A nova lei também define que:

• O comprometimento de renda não pode ultrapassar 35% do salário mensal;

• O trabalhador pode usar até 10% do saldo do FGTS como garantia ou utilizar até 100% da multa rescisória, em caso de demissão, para garantir o pagamento;

• São contempladas outras categorias além de empregados CLT: trabalhadores domésticos, pessoas que atuam por aplicativo, MEIs, trabalhadores rurais;

• Os descontos podem incidir sobre múltiplos vínculos, desde que autorizados pelo trabalhador;

• A lei prevê que instituições de fiscalização e educação financeira atuem para proteger o consumidor.

Com essa mudança, expandiu-se o público elegível ao consignado, mas também surgem novos desafios — em especial, o risco de juros elevados, dependendo do perfil do solicitante.

Ocorre que o Banco Central constatou que nos casos novos de consignado privado, as taxas chegam a ser superiores ao que era cobrado nos contratos antigos com convênios.

Isso ocorre mesmo que, em princípio, o mecanismo de desconto em folha ofereça segurança ao banco. (Ainda não há um teto definido para essa nova modalidade.)

Conforme dados mais amplos divulgados pelo Banco Central temos que:

• Até julho de 2025, a taxa média mensal para o novo consignado privado alcançou apro-ximadamente 3,9% ao mês (ou cerca de 58% ao ano).

• Essa taxa é bastante superior à média dos consignados antigos com convênios entre empresas e bancos, que chegava a cerca de 2,6% ao mês (ou 36,2% ao ano).

• Mesmo sendo mais cara que o consignado tradicional, essa nova modalidade permanece com juros muito inferiores aos do crédito pessoal não consignado, cuja média pode superar os 6,2% ao mês.

• Também há forte influência do perfil de risco do tomador: trabalhadores de empresas menores, com menor renda, menor tempo de vínculo, estão sendo cobrados taxas mais elevadas, porque são considerados mais arriscados pelas instituições financei-ras.

• Em agosto, a taxa média estabilizou em 3,79% ao mês para operações na nova modalidade.

• Paralelamente, os valores médios dos empréstimos vêm sendo menores do que no modelo de convênios antigos, o que reduz o montante que muitos trabalhadores conseguem acessar.

Esses dados apontam para um cenário dual: por um lado, mais trabalhadores conseguiram aces-sar o consignado; por outro, muitos estão contraindo empréstimos com taxas bastante mais altas do que era esperado.

Por que os juros estão mais altos?

Há várias razões para que os juros da nova linha estejam subindo mais do que o ideal:

1. Risco do tomador

Os novos tomadores tendem a ter menor estabilidade, menor tempo de vínculo e menor renda — características que multiplicam o risco para o credor.

2. Operações de menor valor e prazo

Os contratos são menores, com prazos mais curtos, o que reduz a margem de lucro e obriga o banco a “compensar” o custo pelo risco.

3. Ausência de teto claro para juros

Ainda não foi fixado um limite máximo para o novo consignado, o que permite que os bancos adotem taxas altas de acordo com o risco.

4. Custo de captação e ambiente macroeconômico

Em períodos de taxas de juros elevadas e inflação persistente, os bancos repassam custos maio-res aos clientes para conservar margens.

5. Fase inicial e efeitos de aprendizado

A nova modalidade é recente, com dados limitados de histórico. Assim, os bancos aplicam “prêmio de incerteza” até conhecer melhor o comportamento dos devedores.

Esses fatores combinados podem explicar por que muitos contratos no novo regime estão apresentando juros mais altos do que o esperado.

Riscos para o trabalhador

• Superendividamento: se as parcelas consumirem demais o orçamento mensal, o traba-lhador pode cair em espiral de dívidas.

• Prazos longos: contratos muito alongados reduzem o valor da parcela, mas aumentam o custo total (juros sobre juros).

• Menor flexibilidade financeira: ter grande parte da remuneração comprometida limita margem para imprevistos.

• Possibilidade de falha no repasse: embora a lei imponha obrigações ao empregador, há casos em que descontos não são repassados corretamente.

• Adesão automática: há risco de contratos “empurrados” sem que o trabalhador perceba integralmente os termos e implicações.

Se você é empregado no setor privado e avalia contratar consignado, aqui vão recomendações essenciais:

1. Faça simulações em diferentes bancos

Compare taxas, prazos e encargos via a plataforma “Crédito do Trabalhador” ou nos aplicativos dos bancos. Mesmo pequenas diferenças podem impactar bastante no valor final pago.

2. Não comprometa demais sua renda

Respeite o limite legal de 35%, mas tente manter margem para despesas essenciais e imprevistos.

3. Prefira prazos mais curtos

Se possível, opte por parcelamentos mais curtos para reduzir os juros compostos acumulados.

4. Atenção ao Custo Efetivo Total (CET)

Observe todos os encargos — taxas, seguros, tarifas — não apenas a taxa nominal do juro.

5. Use o FGTS com cautela

A garantia oferecida com parte do FGTS pode reduzir juros, mas comprometer parte do seu patrimônio de proteção futura. Avalie se vale a pena.

6. Analise seu perfil de estabilidade

Se você está em emprego recente, de menor porte ou com histórico instável, o risco de ser cobrado tarifa mais alta é maior. Avalie se vale esperar um momento mais seguro.

7. Evite “empréstimos por impulso”

Sempre tenha um plano claro para a finalidade do crédito: quitar dívidas caras, investimento em algo produtivo ou necessidade emergencial.

8. Verifique a reputação da instituição

Prefira bancos e instituições já bem estabelecidas, com histórico de transparência.

9. Acompanhe os repasses do desconto

Confirme mensalmente se os valores descontados estão sendo efetivamente repassados ao banco credor.

10. Faça portabilidade se surgir opção melhor

Se outro banco oferecer condições mais vantajosas no meio do contrato, você pode portar o em-préstimo para lá (se a lei e o contrato permitirem) e economizar.

11. Educação financeira contínua

Antes de tomar crédito, fortaleça seu controle de gastos e orçamento. Em muitos casos, reorganizar despesas pode dispensar a necessidade de empréstimo.

12. Cuidado com publicidade enganosa

Não aceite ofertas excessivamente vantajosas sem ler todas as cláusulas. Juros baixos podem ocultar taxas ou seguros caros.

O crédito consignado, apesar de ser uma opção vantajosa em muitos casos, não é garantia de condições favoráveis por si só. Com a nova modalidade para trabalhadores do setor privado, o cenário ficou complexo: taxas médias mais altas, risco individual elevado e menor previsibilidade.

Para quem pretende contratar, o caminho seguro é o da comparação, cautela e planejamento. Simule muito, não comprometa todo o orçamento, cheque todas as cláusulas e mantenha controle financeiro rigoroso.

Dessa forma, você pode obter crédito quando necessário sem cair em armadilhas de juros exces-sivos e comprometer a própria estabilidade financeira.

Pensem nisso e até a próxima !

Ana Alves

@anima.consult

Economista, Consultora, Professora e Palestrante

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